Entrevistas

KRAPULA – Brutal death metal sem meias palavras

 

O Brutal death metal foi um estilo que atingiu o Brasil como um martelo esmagando faces naqueles primeiros anos dos 90 e dentro desse contexto algumas bandas começaram a aparecer e abraçaram o lado mais bruto do estilo. Uma dessas bandas foram os recifenses do KRAPULA, grupo formado em 1992 e que deixou seu nome gravado dentro do underground pernambucano.   Falamos com os membros Danilo e Bartô e passamos um pouco dessa história a limpo…

Por Fábio Brayner

Saudações, Bartô e Danilo. É uma grande satisfação contar com vocês no portal do THE OLD COFFIN SPIRIT zine. Bom, o KRAPULA foi formado em 1992 e ficou na ativa por vários anos. Quando a banda parou?  E qual foi a razão para esse encerramento das atividades?

Bartô. Grande Fábio! A satisfação é nossa! O KrapulA parou as atividades entre 1999 e 2001. Após a saída de um dos integrantes, passamos um tempo procurando substituto, mas sem êxito. Por ser estilo brutal, à época tivemos poucos candidatos e não conseguimos continuar sem baterista. Então, outras atividades demandaram os que ficaram e a banda parou sem data para retorno.

Danilo. Salve Fábio. Obrigado pela chance no T.O.C.S. zine. Não sou membro original. Tive uma breve passagem (1997-8) e gravei o único registro até então (“Breaking Teeth”/1998 – demo CD). Após a saída do grupo, mantive as atividades até 2009, numa banda que tinha fundado e noutra conhecida da região. Infelizmente, pela falta de sorte com baterista efetivo e outros fatores, ocorreu esse hiato na história do KrapulA. Em meados de 2013 reatamos contato, e o instinto falou mais alto.

Em 2015 vocês decidiram voltar à cena. Era o momento certo para voltar a destilar a brutalidade musical que sempre foi marca registrada da banda?

Bartô. Acredito que sim. Voltamos no momento certo, principalmente por razões pessoais. O KrapulA significa muito para nós e voltar com a rotina de ensaios e composições fez muita diferença para todos. Eu nunca tive como base o arrefecimento da cena metal para movimentar a banda, mas, voltar em uma onda de ressurreição do metal teve seus benefícios.

Danilo. Conversamos muito sobre o possível de retorno. Foram quase dois anos de conversa, em reuniões ocasionais, haja vista que o afastamento dos membros durou muito tempo. Esses encontros foram cruciais, pois através deles ajustamos que todos contribuiriam para o progresso da banda, reforçando nossas interpretações de brutalidade. Feito isso, sim, vimos que era o momento de voltarmos a atacar (risos).

Como está a formação da banda em 2020? Vocês continuam com apenas uma guitarra ou tem planos de colocar outra guitarra para deixar o som ainda mais pesado?

Bartô. A formação em 2020 está muito irada, arrisco dizer que é a mais concisa, técnica e devastadora. Ao longo do tempo, apesar de distantes dos palcos, a maturidade nos deu uma consciência sonora diferenciada. Além disso, contamos com um novo baixista (Francisco Olay) que tem agregado muito a banda. Essa mudança foi estratégica e nos tirou da zona de conforto, principalmente no meu caso. Desde que fundei a banda e assumi o baixo, fiquei na posição mais foda para mim. Os graves realmente transmitem muita energia e conferem peso ao som. Agora, como vocalista, é possível explorar novos meandros da brutalidade sonora, ainda mais se tratando de gutural. Em relação ao segundo guitarrista, já tivemos uma formação com cinco membros e hoje tudo flui melhor com uma estrutura mais compacta. Ao vivo às vezes, faz falta. Não descartamos a possibilidade.

Danilo. Eu vejo que temos a formação com a química mais apurada. Não nos preocupamos com relevância – procuramos fazer as músicas sem nos ater a determinadas conceituações e temos obtido resultados satisfatórios. Como nos conhecemos de longa data, dialogamos bastante sobre a situação e o futuro do KrapulA. A pauta de ações é bem estipulada.

O KRAPULA é uma banda formada em um momento totalmente diferente da cena metal. Que memórias vocês têm daquela velha cena recifense?  E como comparariam com a cena que vocês encontraram ao voltar com a banda em 2015?

Bartô. Quando resolvi criar uma banda com meus amigos de condomínio, tínhamos uma razão em comum; todos nós havíamos passados por muita dificuldade na vida e a banda era a válvula de escape. A brutalidade como tema tinha uma razão: a revolta; tudo era muito difícil para nós. Tudo isso foi sintetizado na agressividade expressada nas músicas e de uma forma mais carnal. Além disso, o fato de gostarmos de bandas em comum nos uniu. Por essa razão, na época de formação da banda foi realmente diferente do estilo das demais na cena regional. Quando voltamos em 2015, várias outras bandas voltaram inclusive no cenário nacional e muitas outras haviam sido criadas recentemente. Vejo com bons olhos, pois para mim representa a força e resistência do metal e que nem tudo está perdido (risos).

Danilo. A década de 1990 foi o auge do underground em termos de brutal death metal. Shows com públicos consideráveis, muita rebeldia e empolgação, em locais geralmente aquém das condições mínimas que se exige hoje em dia, mas a atmosfera era “quente”. Quando do nosso retorno, senti esse brio, mas esfriou um pouco nos últimos anos. Atualmente temos bandas boas, acesso a equipamentos de qualidade, ampla comercialização de materiais, locais para eventos e recursos – alguns inimagináveis cerca de vinte anos atrás, mas o público aparenta estar “engessado”. Talvez, não se renovou na velocidade adequada, mas acredito que em breve teremos uma oxigenação. Conhecer bandas e adquirir materiais na internet é válido, mas headbanging, mosh pit, stage diving são manifestações de uma cultura que não deve se esvair por comodidade. Os eventos formam a verdadeira memória para as futuras gerações: contribuem com segmentos mercadológicos e propiciam a formação de nichos ideológicos. Afinal, inexiste underground apenas por via remota.

No site Metal Archives diz que o EP “Odes to Chaos” é de 2017, mas lembro da divulgação de vocês ter realmente aparecido no início de 2019, a época em que resenhei o material inclusive. Quando o material foi realmente lançado?

Bartô. O EP “Odes to Chaos” passou por várias etapas até sua conclusão e lançamento. A distância é uma grande dificuldade. Desde 2004 saí de Recife e fui morar em Santos/SP. A gravação foi no J.A. Estúdio, Camaragibe/PE (excelente trabalho do produtor Joel). Então, perdemos mais um tempo até conciliarmos a disponibilidade de todos. O outro grande desafio foi regravar todo o vocal. Tivemos baixas na função quando estava prestes a ser lançado, causando outra grande pausa no lançamento. Finalmente, no dia 31 de janeiro de 2019, o EP subiu para as plataformas do mundo todo. Desde o lançamento alcançamos diversos continentes. Jamais imaginamos o alcance sem muita divulgação.

Danilo. Tivemos dois momentos difíceis e inusitados durante a gravação do EP, mas lidamos com ambos da forma correta, considerando as circunstâncias, pois o problema era o mesmo. Na primeira situação, tentamos reintegrar o vocalista que tinha sido desligado antes do começo das gravações. Na segunda, sabendo que a procura por um novo frontman demandaria muito tempo, decidimos que Bartô assumiria os vocais, e passamos a buscar um baixista. Deveríamos ter feito isso antes (risos).

“Odes To Chaos” traz um KRAPULA menos brutal e com mais trampo no instrumental, me lembrando inclusive o Cannibal Corpse. Eu lembro dos velhos tempos e a banda era muito mais brutal. Esse direcionamento foi sendo moldado antes da parada ou é algo mais recente? Eu particularmente achei a banda muito melhor.

Bartô. Nossa proposta foi sempre a mesma: transmitir o recado com bastante agressividade e energia. O “Ode To Chaos” contém faixas daquele período. Na primeira fase, vamos assim chamar, fizemos muitas apresentações ao vivo e a demo (“Breaking Teeth”) foi feita de forma mais rústica, praticamente sem mix e master, talvez por isso a soe mais agressivo. Porém, hoje prezamos ainda mais pela qualidade, e contando com mais recursos, conseguimos um trabalho mais elaborado. Estou muito feliz pelo seu feedback. Sem dúvida, tem muito peso. \m/

Danilo. Seu apontamento sobre a mudança na sonoridade é pertinente, e tem uma justificativa simples: a química que encontramos e tentamos manter. Não somos afetos a rótulos, estilos, gêneros etc., o que nos ajuda a moldar os temas e riffs selecionados. Esse método nos permite vasculhar muitos meandros, filtrando e introduzindo o melhor deles nas composições. Assim, o som sempre soará brutal, mas sem utilizarmos das mesmas ferramentas – pelo menos não do mesmo jeito (risos). Quanto à sonoridade do EP, a participação direta de nosso guitarrista (Graydson Romano) na produção foi o fator que garantiu a identidade sonora das faixas.

Vocês tinham um show marcado para o próximo 8 de maio em Recife, mas o mesmo foi cancelado por causa da pandemia que tem assolado o mundo todo. Em relação ao metal como vocês avaliam o impacto desse momento na cena metal como um todo?  Muita gente fala muito que “nada será como antes”. Vocês concordam?

Bartô. Sim. Eu mesmo nunca imaginei vivenciarmos algo assim. Parece que estamos em um filme catástrofe. Tal fato mostra a nossa vulnerabilidade quanto à saúde e principalmente quanto ao governo. As coisas podem até voltar a ser como antes, mas vai demorar bastante, sobretudo quanto aos hábitos de higiene e relações interpessoais. Assim como outros setores afetados que dependem de público, acho que a cena metal deve se adequar para atravessarmos essa fase, fazendo lives, eventos virtuais e afins. Agora é a hora de invertermos o sentido e irmos até a casa do público.

Danilo. Creio que estaremos em outra realidade, num outro modo de “normalidade”. É muito cedo para ilações mais profundas, mas vejo que praticamente todos os setores serão afetados. Um deles, o próprio cenário metal, principalmente no tocante à realização das atividades: não sabemos como serão as regras para aglomerações daqui pra frente, tampouco como será o ritmo nos estúdios, por exemplo. Mas concordo com Bartô: neste momento, as bandas terão que buscar a aproximação do público fazendo uso dos meios tecnológicos ao alcance.

Quando poderemos ter um novo lançamento do KRAPULA? Há alguma possibilidade de algo ser lançado por uma gravadora?

Bartô. Sem previsões, mas temos material para um novo lançamento.  O KrapulA está equilibrado quanto aos integrantes e com os pés no chão. Quanto à gravadora, sim. Estudamos algumas propostas, umas indecentes outras razoáveis. No momento certo acontecerá.  

Muito obrigado a vocês dois pelo tempo e espero ouvir novidades do KRAPULA em breve.

Bartô. Nós que agradecemos pela oportunidade. Iniciativas como essa resgatam e registram a história do metal. Para o KrapulA (underground do underground, como costumo dizer), será sempre uma honra. Grande abraço!

Danilo. Obrigado mais uma vez pela oportunidade. O crédito por nosso trabalho significa muito para nós. Forte abraço. Long life, T.O.C.S. zine. Hail!

KRAPULA online: https://www.facebook.com/krapulaband/

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