Entrevistas

SUFFERING HOUR – Disco do ano? A banda entrega uma das obras mais certeiras do metal extremo

Conversamos com os três membros do SUFFERING HOUR sobre a evolução da banda desde sua criação, métodos de trabalho, filosofia, e o grandioso “The Cyclic Reckoning”, que vem chutando traseiros tudo esse ano com seu Blackened Death Metal.

Senhores, sejam bem-vindos ao The Old Coffin Spirit Zine / Portal. Devo começar dando os parabéns pelo novo álbum “The Cyclic Reckoning”,que soa massivo, e definitivamente se coloca entre os competidores sérios pelo Álbum do Ano. Ele é também o seu primeiro trabalho via “Profound Lore”. Vocês estão felizes com a recepção do álbum e a parceria com o selo canadense?

IsN: Muito obrigado pelas palavras, ficamos realmente felizes. Eu acho que eu falo por nós três quando digo que nós estamos mais que entusiasmados por estarmos na “ProfoundLore”. A distribuição é ótima, e o alcance a novos fãs tem sido incrível para nós. Não poderia agradecer ao “Chris” e à “ProfoundLore” o suficiente, por tudo que eles têm feito por nós.

O nome da banda é uma homenagem ao ANACRUSIS, e o grande álbum de estreia de Thrash/Prog deles. Também demonstra muito respeito pelas suas raízes no Thrash Metal. Como foi essa transição para o Blackened Death atual do SUFFERING HOUR?

YhA: Foi muito suave, nós apenas atingimos um ponto em que sabíamos que não poderíamos continuar escrevendo Thrash, mantendo-nos honestos conosco, tanto como indivíduos quanto como músicos. Nós ainda amamos o Thrash até a morte, mas enquanto estávamos crescendo como seres humanos e expandindo o nosso conhecimento musical, nós sabíamos que teríamos que começar a escrever num estilo que se encaixasse melhor com o lugar onde nossas mentes estavam naquele ponto. Também é um processo contínuo, e especialmente com a quantidade tão mínima de Metal que eu tenho ouvido hoje em dia, posso quase garantir que, daqui a dez anos, nós soaremos muito diferente do que soamos neste momento.

O “The Cyclic Reckoning” soa como um álbum que demandou bastante tempo na sua preparação. Como foi a sua criação e gravação?

IsN: Pra mim, pessoalmente, escrevi quase que inteiramente todas as minhas partes de bateria, dessa vez. Eu tinha adicionado algumas das minhas próprias características no passado, mas dessa vez eu realmente elevei o nível. Olhando pra trás, já tem coisas que eu teria feito diferente, mas ter espaço para crescer e melhorar não machuca, e me dá mais oportunidades para tentar coisas novas no futuro. O processo de gravação foi incrível. Foi a primeira vez que eu pude ensaiar e gravar num estúdio de verdade, e a experiência foi ótima. Eu definitivamente me senti mais sintonizado com a gravação, já que todo o espaço foi criado para se fazer música nele. Nós havíamos feito todo o resto nos nossos respectivos porões, então foi uma oportunidade incrível.

O disco tem uma atmosfera muito densa, à qual as letras se encaixam perfeitamente, profundamente enraizadas nas emoções humanas, batalhas internas, a busca pela iluminação, e a morte. Como vocês decidiram escrever sobre isso? Vocês são grandes fãs de filosofia?

DgS: Eu escrevo quase que exclusivamente sobre coisas que vêm de dentro de mim, minhas próprias emoções, ideias, batalhas mentais e coisas que vejo no mundo. Eu sempre senti que essa seria a forma mais apropriada de complementar as composições do “YhA”, já que ele passa por muitas emoções semelhantes, e realmente as utiliza pra inspirar sua música. De fato, eu não acho que eu conseguiria escrever honestamente de outra maneira. Estou sempre brincando com formas diferentes e interessantes de descrever metaforicamente as minhas ideias, e filtrá-las por meio de múltiplas lentes, e visões diferentes. Surpreendentemente, não sou muito bem versado em filosofia, mas tenho enorme interesse nisso, e é algo sobre o qual eu adoraria aprofundar-me.

Qual é a sua interpretação da Morte em si? Ela certamente parece ser um tema de grande atração para os membros da banda.

DgS: Eu acho que a morte é o fim, o infinito, mas também possivelmente o início, o desconhecido entre um oposto e outro, e tudo para o qual nossas vidas estão nos conduzindo. Há tantas interpretações diferentes para isso, e eu estou aberto a muitas delas.

Conte-nos mais sobre a “The Foundations of Servitude”, o colosso que fecha o álbum magistralmente (escolher uma música favorita não foi tarefa fácil, só pra vocês saberem):

IsN: Honestamente, “Foundations” é a minha música preferida também. Foi a mais desafiadora de se aprender, escrever e estruturar, motivo pelo qual creio ser tão recompensador escutá-la novamente, e tocá-la integralmente. Sinto que essa faixa, em particular, estava destinada a ser a peça de fechamento desde o início. Os riffs de “YhA” são absolutamente incríveis nela, e eu me lembro vividamente de sentir calafrios quando estávamos gravando os últimos grandes ataques aos pratos, que concluem o álbum. A mesma coisa aconteceu durante a “Empty Avowals” no “In Passing Ascension”. (OBS: última faixa do disco anterior). Não há sensação como a de saber que as notas que você está prestes a tocar, serão as últimas que você gravará para o disco. Parte de mim sempre fica um pouco triste quando uma gravação termina, porque até aquele ponto, eu terei consumido um ano trabalhando naquelas músicas, escrevendo, compondo e arranjando tudo. Mas é sempre legal desapegar, e curtir os frutos de todo o nosso trabalho.

Podemos falar um pouco sobre a arte de capa do “Artem Grigoryev”? Se eu não estou enganado, ele deu o nome à obra de “Lightbringer” (OBS: Portador da Luz), e é uma bela peça. Você acha que ela captura bem a essência do disco? Além disso, ele teve a oportunidade de ouvir o álbum antes de trabalhar na ilustração?

DgS: Sim, “Lightbringer” foi o título que ele criou para a obra. Eu permiti que o “Artem” tomasse o seu próprio direcionamento com a obra, mas ela acabou funcionando muito bem, uma vez que a figura do “Portador da Luz” meio que representa a superação da batalha e a busca pela iluminação. O estilo de ilustração definitivamente se encaixa com a vibração geral da música e da produção também, acredito. Na época em que “Artem” começou a trabalhar na arte, o álbum ainda não estava finalizado. Eu devo ter enviado a ele uma demo bruta de uma ou duas músicas, mas ele trabalhou, principalmente, com base apenas nas minhas letras e na sua própria intuição.

Que tipo de música vocês normalmente ouvem, se é que existe alguma, quando vocês estão trabalhando no seu próprio material?

YhA: Sempre que eu estou escrevendo ativamente para o SUFFERING HOUR, eu ouço música mais desconectada e longe possível do nosso estilo musical. Normalmente, é um monte de cantores/autores, música folk, slowcore, esse tipo de coisa. Bandas como WOVENHAND(OBS: Country alternativo de Denver, no Colorado), LEONARD COHEN (Cantor e poeta canadense), 40 WATT SUN (Doom Metal/Rock Atmosférico do Reino Unido), TOWNES VAN ZANDT (Cantor e compositor norte-americano), SUN KIL MOON (Folk Rock de San Francisco, Califórnia), DBUK (Denver Sound/Gothic Country de Denver, Colorado), SONGS OHIA (Projeto de Folk contemporâneo/Slowcore de Jason Molina, de Ohio/EUA), coisas desse tipo.

Quais são as suas maiores influências como músicos, como elas impactam a sua criação, e que som vocês estão tentando alcançar? A música atual da banda soa bastante única, e isso é algo muito significativo hoje em dia.

YhA: Meu objetivo geral quando estou escrevendo música com o SUFFERING HOUR é compor aquilo que eu quero, como eu toco, independentemente de se encaixar ou não em um determinado subgênero do metal, mas em qualquer gênero. Obviamente, somos uma banda de metal, mas é apenas algo que ocorre organicamente. Eu tento escrever qualquer coisa, menos metal, e no final tudo cai de volta dentro da caixa do metal, e se transforma em algo realmente especial. Eu ouço tantos estilos musicais diferentes quanto posso, sejam eles legais de ouvir ou não. Nem sempre vou gostar de tudo que eu escuto, mas mesmo se eu encontrar alguma banda da qual eu não goste de 98%, pode haver alguma coisa naqueles 2% que eu possa tirar para tentar aplicar à minha maneira de tocar. Ultimamente, eu tenho dado um grande mergulho em Noise Rock e Post Punk/Hardcore, há uma tonelada de composições e formas de tocar malucas naquele mundo, que eu tenho achado muito influentes. Eu meio que estou num ponto onde não tenho muitos músicos para os quais eu possa apontar, e dizer que sejam uma influência direta pra mim, mas algo que me inspira mais que qualquer outra coisa são os músicos que tocam o foda-se e apenas fazem qualquer coisa que eles queiram, sem receio da repercussão, e que conseguem construir uma carreira a partir disso.

Vocês são três músicos muito talentosos, técnicos, mas ainda assim altamente criativos. Vocês curtem olado mais técnico do Metal Extremo? Quais são os seus preferidos?

YhA: Não muito, honestamente. O tecnicismo não veio tanto por ouvirmos muita música técnica, quanto veio por sermos uma banda de apenas uma guitarra, e tentarmos não apenas condensar partes múltiplas de guitarra em um instrumento quanto possível, mas também do desejo de preencher o máximo possível de espaço sônico com o que temos. A única coisa mais técnica que eu curto é o Tech Thrash e Death do final dos anos 80 e início dos anos 90, coisas como CORONER, DEATH, OBLIVEON, BELIEVER, ATHEIST, DEATHROW, SADUS, etc.

Eu estava lendo sobre a turnê europeia do SUFFERING HOUR programada para maio de2022. Como vocês se sentem impedidos de tocar hoje em dia, e como estão lidando com a ansiedade pela turnê? Há planos para shows nos Estados Unidos também?

IsN:Assim como todo outro músico no planeta agora, nós nos sentimos extremamente frustrados por não podermos fazer shows. Nossa turnê com o BØLZER estava agendada para acontecer exatamente antes de tudo ser fechado. Aquela era uma turnê pela qual eu estava muito ansioso, e espero que seja remarcada em algum momento. No entanto, houve inicialmente muitos pontos positivos nos lockdowns. Eu comecei a fazer aulas online de bateria, e a aprender técnicas que me tornarão mil vezes melhor quando nós retornarmos aos palcos. Eu também coloquei a minha saúde sob controle depois de ter passado por um caso muito ruim de pneumonia em março de 2020. Comecei a malhar e comer direito, o que me ajudará a performar melhor assim que voltarmos a tocar ao vivo. Muito do que eu faço na minha vida pessoal é diretamente influenciadopelo quanto isso afetará positivamente a banda. Todos nós realmente trabalhamos duro na melhoria da banda, sob todos os aspectos.

 Quais são os seus cinco álbuns favoritos de todos os tempos, aqueles sem os quais você não vive?

YhA: Isso muda tanto que eu não acho que poderia escolher um top cinco absoluto de todos os tempos. Neste exato momento, os discos que eu tenho mais ouvido são, provavelmente, “You Won’t Get What You Want” do DAUGHTERS (OBS:banda de Noise Rock de Rhode Island/EUA), “The Moon is a Dead World” do GOSPEL (banda de Post-Hardcore, Screamo de Nova Iorque/EUA) “Hosannas from the Basement of Hell” do KILLING JOKE (banda de Post-Punk do Reino Unido), “Scissorgod” do REVEAL (banda de Noise Rock/Thrash Black Metal da Suécia)e o álbum ao vivo dos SWANS (banda de Rock Experimental, Noise Rock de Nova Iorque/EUA) “Swans are Dead”. Meu gosto musical é tão inconsistente e eclético que fica difícil escolher quais seriam os meus discos favoritos absolutos.

Como é a sua relação com o Metal Brasileiro, ou a música brasileira em geral? Tem preferência por alguma das nossas bandas?

R: IsN: Odeio dizer isso, mas eu realmente estou por fora sobre o que tem acontecido no Metal esses tempos. Não posso dizer que tenha alguma banda de metal brasileira em particular que eu tenha ouvido recentemente, e que tenha de fato me impressionado, mas estou totalmente aberto a sugestões! (OBS: Este redator está providenciando uma boa lista de metal brasileiro para recomendar à banda)

O SUFFERING HOUR até aqui já lançou dois álbuns de estúdio bem-sucedidos e dois EPs sólidos, e acabou de começar a trabalhar com um dos selos mais importantes do mundo de metal extremo (“Profound Lore Records”, do Canadá). O que está reservado para a banda a seguir, e quais são seus principais objetivos?

DgS: Acredito que o nosso objetivo principal ao longo de 2022 seja tocar mais shows ao vivo novamente e, finalmente, promover adequadamente o “The Cyclic Reckoning” na estrada. Nós também tiraremos bastante tempo nos reagrupando, fazendo uma tonelada de ensaios de verdade e, aos poucos, começando a encontrar um novo som e fórmula para escrever música nova juntos. Acho que os próximos dois anos serão meio que um ponto de virada, para nós realmente aprimorarmos nossa criatividade juntos, e darmos nova vida à banda.

O Split com o MALTHUSIAN vai realmente acontecer? Seria, com certeza, um grande lançamento. Podemos esperar por novos lançamentos no horizonte próximo?

DgS: Sim, o Split com o MALTHUSIAN está totalmente concluído agora, e será lançado no início de 2022 sob a “Invictus Productions”. Depois disso, provavelmente levará um longo tempo até que tenhamos um outro lançamento.

Na sua opinião, existe alguma forma de escaparmos dos temidos “Cycles of Reckoning” (OBS:Ciclos de ajuste de contas / juízo final) que o álbum explora com tanta eloquência?

DgS: Hah! Essa é uma pergunta inteligente, na verdade. Eu diria subjetivamente, sim, é uma possibilidade. É algo na minha vida pessoal que eu realmente tenho conseguido trabalhar recentemente. O título do álbum é retirado da letra de “The Foundations of Servitude”, que é mais ou menos baseada nas minhas lutas contra a Desordem Compulsiva Obsessiva, mas também faz referência a alguns outros conceitos amplos no grande esquema do mundo e da sociedade. Em uma frase eu afirmo “only in scarce fate is a severing of progression” (OBS: apenas em um destino escasso há um rompimento da progressão) e outra onde eu retoricamente coloco esta mesma questão: “What costs will it necessitate a rebirth, A breaking of succession?” (OBS: Quais custos serão necessários para um renascimento, Uma quebra da sucessão?). Portanto, eu deixo em aberto a possibilidade de me libertar dos ciclos de miséria. Essas possibilidades também se relacionam com alguns dos temas nas outras trilhas do despertar pessoal e a busca por iluminação.

Muito obrigado pelo seu tempo, foi legal demais conversar com vocês três, e eu espero poder vê-los no palco tão logo seja possível. Uma turnê Sul-Americana seria incrível! Por favor, sintam-se à vontade para deixar uma mensagem aos nossos leitores!

IsN: Obrigado a todos pelo apoio. O fato de podermos alcançar tantas pessoas ao redor do mundo, e provocar um impacto com a nossa música, significa o mundo para mim. Saúde!!

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