Black Metal e filosofia num trabalho impactante, intenso e melódico. Seu título: “Descent Towards Death” (Northern Silence Productions). O Old Coffin Spirit Zine/Portal teve o prazer de conversar com o duo LOS MALES DEL MUNDO (Cristian Yans e Dany Tee) para saber mais sobre o início do projeto, sobre a confecção do álbum e planos. “Acreditamos que a música e a arte em geral devem estimular o ouvinte a fugir dos limites racionais e se deixar levar por uma jornada introspectiva”.
Bem, sejam bem-vindos ao Old Spirit Coffin Zine/Portal. Gostaria de parabenizá-los pelo excelente trabalho de estreia, o assombroso, “Descent Towards Death”. Vocês têm recebido varias criticas positivas e muitos elogios da mídia especializada, mas não apenas, também conquistando fãs das mais diversas partes do mundo. Vocês esperavam por tamanha repercussão e por todo esse feedback positivo?
Cristian Yans: Estamos muito gratos pela forma como o álbum tem sido recebido pelo povo, assim como pela imprensa nacional e internacional. A resposta tem sido ótima e nos dá a sensação de que eles foram pegos pela música e pelo conceito que está por trás dela, já que é um álbum que vai à contramão da tendência atual, considerando que hoje em dia, o tempo de escuta e atenção são muito baixos. Felizmente, as pessoas se conectaram e apreciaram nosso trabalho do início ao fim, curtindo a jornada que ele proporciona e nada é mais gratificante do que isso.
O ep, homônimo, foi lançado de forma independente em 2020, já o álbum completo foi lançado pelo selo alemão Northern Silence Productions — um dos maiores especialistas em Black Metal e demais ramificações do gênero. Como surgiu a oportunidade de trabalhar junto ao selo?
Cristian Yans: Desde o início, tivemos uma série de ofertas de algumas gravadoras interessadas. Mas a pandemia chegou e em meados do ano passado nos encontramos com o álbum finalizado, e sem uma gravadora para lançá-lo. Foi assim que lançamos o Ep depois de alguns meses de espera e, enquanto isso, estávamos analisando sobre qual gravadora entrar em contato caso não obtivéssemos uma resolução favorável. Sempre tivemos a “NSP” em mente pelos bons comentários que sempre recebemos dos amigos da cena e que trabalharam com eles. Então, semanas após o lançamento do EP, nós os contatamos e nos oferecemos para lançar o álbum; recebemos uma resposta no dia seguinte e começamos a trabalhar nos detalhes da assinatura do contrato.
O músico Nikita Kamprad (Der Weg Einer Freiheit) trabalhou tanto no ep quanto no álbum e em ambos como baixista e produtor (aliás, a produção é meticulosamente estupenda). Como surgiu essa parceria?
Dany Tee: Conheci Nikita quando ele lançou sua demo com a “DWEF” em 2009, entrei em contato com ele, então, pelo Myspace e a partir daquele momento começamos uma amizade onde sempre falamos sobre nossa intenção de trabalharmos juntos, mas nunca tivemos sucesso em fazer acontecer devido à falta de tempo e vários compromissos. Em 2016 começamos a conversar concretamente sobre a ideia de fazer algo, mostrei-lhe o que havia gravado com o Cristian e ele gostou da ideia de participar de uma forma ou de outra. Entendendo que sua prioridade era e é “DWEF” , ele se encarregou de compor as linhas de baixo e gravá-las, além de produzir, mixar e masterizar o EP e o álbum. Nikita não é apenas um excelente compositor e multi-instrumentista, mas também um incrível produtor com quem aprendemos muito em todo o tempo que trabalhamos juntos, e embora ele não seja um membro da banda, nós o consideramos uma parte importante e fundamental do projeto, tanto é que já falamos sobre como vamos abordar as futuras gravações.
O “D.T.D.” é um trabalho furioso e desesperador, mas, em simultâneo, atmosférico e melodioso. Ele consegue soar orgânico como as produções dos 90s (robusto e melodioso) e atual, devido ao desenvolvimento e das composições e sua intensidade. Como foi o processo de composição dele, houve algum desafio ou contratempo?
Dany Tee: Na verdade, a composição começa no final de 2016 e as duas primeiras músicas que escrevemos foram aquelas músicas que foram lançadas posteriormente no EP. Todo o processo de composição está de alguma forma conectado, mas aquele EP é um pouco mais direto e talvez mais focado em um Black Metal Melódico, enquanto as músicas que escrevemos para “Descent Towards Death”; têm outro trabalho de composição que encontramos enquanto trabalhamos no todo o conceito por trás do álbum. Foi um processo cíclico de vaivém, desde a criação da melodia e a experimentação de padrões rítmicos até a escrita das letras e o esboço das linhas vocais. Feito isso, trabalhamos e experimentamos diferentes variações e, se não estivéssemos totalmente convencidos, voltávamos ao início, ao ponto de partida, para corrigir algumas coisas e começar todo o processo de novo. Como se fosse um percurso circular, modificando a música e a letra até ficarmos completamente satisfeitos com cada faixa. No que diz respeito à gravação, foram meses morando juntos no estúdio em busca de um som do zero, tentando ir além de tudo que já havíamos feito até então. Isso nos fez colocar este trabalho como prioridade exclusiva durante os quase 3 anos que todo o processo levou, o que nos permitiu estar muito conectados com a música e com o conceito do álbum em cada detalhe. Como cada um de nós trabalhava durante o dia, aproveitávamos o tempo livre noturno para compor e gravar sem interrupções. Consistia em ir de nossos empregos para o estúdio de gravação e trabalhar incansavelmente neste álbum. Foi um processo muito intenso e o resultado é verdadeiramente especial para nós pelo esforço que investimos.
O Los Males Del Mundo surgiu em 2016 como um projeto de estúdio, como e de onde surgiu a ideia para criá-lo? Exitem planos para shows futuros?
Cristian Yans: Embora o “L.M.D.M.” seja um projeto de estúdio, não descartamos a ideia de levá-lo aos palcos, mas muitas coisas precisam acontecer para que isso aconteça. Recebemos ofertas para tocar nacional e internacionalmente, bem como ofertas de músicos renomados interessados em tocar conosco. No momento, acho que até que toda essa situação pandêmica melhore, teremos tempo para avaliá-la. O que temos de muito claro é que o “L.M.D.M.” continuará a ser uma dupla e, caso tenhamos que tocar ao vivo, a formação será completada com músicos de sessão.
As letras exibem forte cunho literário/filosófico, com influências explicitas de Schopenhauer, Emil Cioram e Friedrich Nietzsche. O que esses filósofos representam para vocês e qual a razão dessa fuga da temática mais tradicional, digamos, do Black Metal?
Dany Tee: Para esse projeto eu queria levar vários autores e trabalhar com seus textos, isso me permitiu expressar ideias que deram formas às letras do álbum. Interessa-me a visão particular que cada um tem em relação à condição humana, os seus trabalhos permitem-me chegar a uma aproximação ao que quero dizer e muitas vezes funcionam como desencadeadores de alguns conceitos que procuro capturar nas letras, como o conceito de finitude, destino, livre arbítrio, o incomensurável, o sofrimento humano, o tempo cíclico, a morte e tantos outros temas que me motivam a escrever. Acredito que quem conhece suas obras poderá encontrar facilmente essas referências. No meu caso, costumo dar atenção especial às letras e me incomoda um pouco quando são feitas sem comprometer nada, apenas para preencher o espaço das vozes. É por isso que as bandas que mais gosto são aquelas que se comprometem com o que compõem e com o que escrevem. Acreditamos que a música e a arte em geral devem estimular o ouvinte a fugir dos limites racionais e se deixar levar por uma jornada introspectiva.
A capa é assinada pelo Matt Lombard (Cradle Of Filth, Mortuorial Eclipse, Sarah Jezebel Deva, Mortiis), é interessante notar como ela se encaixa ao conceito do disco e também às letras. Como trabalhou com ele?
Cristian Yans: Gostamos muito das artes dele e já o seguíamos nas redes sociais. Sempre que olhávamos para o seu trabalho, concordávamos que ele era a pessoa certa para tornar visível o nosso conceito. Então entramos em contato e contamos a ele o que tínhamos em mente. Mandamos o álbum para ele e ele amou a proposta, ele nos mostrou um material em que estava trabalhando e que ele achou que combinaria perfeitamente com a nossa ideia, e assim foi. Escolhemos algumas imagens que ele nos deu e gradualmente foi se encaixando como um grande quebra-cabeças.
Vocês deixaram o Iggor Cavalera sem dormir (risos). Segundo ele, vocês fazem um “Black Metal assustador”. Como foi receber um elogio desses de um músico que é um dos ícones do Metal Extremo Mundial?
Cristian Yans: Incrível! Foi algo totalmente inesperado, não sabemos como ele ouviu o álbum, imagino que deve ter sido uma daquelas coincidências do acaso, mas ainda não conseguimos superar nosso espanto com as boas vibrações que ele teve conosco e a ajuda que ele nos deu e ainda nos dá para promover a banda. Para nós, ele é uma das maiores influências de nossa adolescência.
Falando sobre influências, quais são as influências de vocês enquanto músicos e compositores e como vocês conduzem as mesmas na hora de criar para existir um equilíbrio entre as mesmas e suas próprias características?
Dany Tee: Composicionalmente poderíamos dizer ser baseado em uma mistura de várias influências, mas sempre mantendo as raízes do Black Metal, que é o que mais gostamos. Você encontrará trechos que vão desde o Black Metal mais agressivo e melódico dos anos 90, (aquele que ouvíamos quando éramos adolescentes), ao mais atual Black Metal, desde sua marca sonora, com estruturas um pouco mais densas e arranjos dissonantes. Também gostamos muito e estamos fortemente presentes em outros gêneros musicais, como Doom Metal, Heavy Metal Clássico e outros estilos que foram marcando seu toque pessoal neste álbum. Em relação ao balanço, embora não fosse algo explícito, o que compusemos tinha a ver com aqueles discos que marcaram a nossa adolescência, e íamos adicionando dicas desta ou daquela banda, mas sem que isso fosse algo voluntário, tentamos simplesmente um arranjo e se soasse como alguma das nossas influências, nós o deixamos porque sentíamos ser autêntica, procurávamos não forçar esse aspecto da composição, sempre tentando respeitar o que pensávamos que a música estava pedindo. O que falamos em detalhes, foi o tipo de som que queríamos para este projeto, fomos completamente claros que não iríamos pela opção de um trabalho rápido e rapidamente descartamos a ideia de fazer algo cru ou lo-fi.
Geralmente o fã tem a visão de que o músico de Metal Extremo só escuta Metal Extremo. O que vocês costumam ouvir que foge a esse imaginário típico? Quais são as bandas que vocês escutam e o que vocês conhecem do cenário Extremo brasileiro?
Dany Tee: No nosso caso costumamos ouvir diferentes estilos de música, com gêneros que variam muito, costumo ouvir música popular, pop, tango, folk, mas sempre procuro dar um tempo para ouvir música clássica, minha época favorita são os períodos românticos e barrocos. Antes da pandemia eu ia a dois ou três concertos por mês, para ouvir grandes orquestras ou pequenas atuações de câmara, é algo que gosto muito e de que sinto muitas saudades. Em relação à cena brasileira, devo admitir que não conheço muito sobre ela, por ser tão vasta, infelizmente só conheço poucas bandas. Quando eu era criança ouvia muito Ratos de Porão e Sepultura e depois, anos depois, Sarcofago chegou aos meus ouvidos. Sobre as “novas bandas” não posso deixar de citar o Thy Light (que é sem dúvida uma das minhas bandas preferidas do Brasil). Também gosto de Jupiterian, Muder Rape, Hecate, Desdominus entre outros.
O que vocês pensam sobre o Epic, o Atmospheric e o Post-Black Metal — subgêneros que apesar de não serem tão recentes, tem ganhado bastante notoriedade e adeptos nos últimos tempos?
Dany Tee: Atmospheric é um subgênero que gosto muito e acho que existem projetos muito bons que se destacam entre as mil bandas que surgiram nos últimos anos. Algo parecido acontece com o Post-Black Metal, mas notei que as bandas do Post-Black Metal que mais gosto são aquelas com membros de bandas de Black Metal que experimentaram o lado do Post-BM. Bandas que ao contrário vieram de outros gêneros e incorporaram um toque de black metal em suas músicas chamando-as Post-Black não me chamam a atenção. Mas não é algo que gere preconceitos a priori, mas só percebi quando me aprofundei um pouco mais nos antecedentes da banda. De uma forma ou de outra, tanto o Amospheric quanto o Post-BM continuam a produzir um bom material que com certeza se tornará um clássico ao longo dos anos.
Quais são os próximos passos do Los Males Del Mundo? Vocês já começaram a juntar ideias para um segundo lançamento? O que vocês almejam enquanto banda?
Cristian Yans: No momento estamos trabalhando na promoção do nosso primeiro álbum sem descanso. Acho que no próximo ano, se a pandemia permitir e as circunstâncias forem certas, começaremos a trabalhar nas músicas do nosso segundo álbum
Gostaria de agradecer pela atenção e tempo. Fiquem à vontade para deixar uma mensagem para os fãs e demais pessoas que estão conhecendo a banda.
Cristian Yans: O prazer é nosso. Muito obrigado pela entrevista e pela divulgação. Um grande olá também a todos aqueles que nos apoiam compartilhando ou comprando nosso material.
Links:
Bandcamp: https://losmalesdelmundo.bandcamp.com
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