Entrevistas

DER WEG EINER FREIHEIT – O gigante do Black Metal Avant-Garde Alemão ressurge vitorioso

O criador Nikita Kamprad falou em detalhes conosco sobre o novo álbum “Noktvrn”, suas inspirações e novo método de trabalho que resultaram no Magnum Opus da banda.

Saudações Nikita, primeiramente gostaria de te dar as boas-vindas ao The Old Coffin Spirit Zine / Portal. Nós já temos um bom número de fãs do DER WEG ENINER FREIHEIT no Brasil, e eles estão realmente ansiosos pelo novo álbum, o qual nós acabamos de resenhar, concedendo merecidamente a nota 10/10. A este ponto, as pessoas já sabem que é um trabalho inspirado principalmente pela Noite, e os elementos que a cercam. Você poderia nos dar mais detalhes sobre as fontes de inspiração, e de que forma o álbum se relaciona às Obras Noturnas do “Chopin”? Eu sei que a música clássica é uma das suas preferidas.

Nikita: Muito obrigado por suas palavras, e por conduzir essa entrevista conosco. Agradecemos muito o seu apoio, e agradecemos cada mensagem que recebemos do Brasil! Quanto a “Noktvrn”, de alguma forma eu sempre quis fazer um álbum sobre a noite, sobre os sonhos e o mundo entre o estar acordado e adormecido. Lembro que houve uma noite, ou melhor, uma madrugada em particular em 2018 ou 2019. Levantei-me bem cedo, entre 5 e 7 da manhã, e de alguma forma ainda estava dormindo, mas também acordado, e pode parecer estranho, mas neste estado de espírito a estrutura básica da música “Immortal” veio à minha mente. Tipo a linha de baixo, bem básica, com a batida simples de bateria e, na verdade, todo o crescendo desde a introdução, do primeiro verso até o segundo refrão. Foi como meia hora, ou até mesmo uma hora enquanto eu estava deitado na cama, os primeiros raios de sol brilhando através das persianas da janela, tentando encontrar um caminho para meus olhos entreabertos, e enchendo o quarto com esse tipo de luz meio púrpura da madrugada – um clima que também queríamos expressar através das cores e gradientes na arte de capa do álbum. Foi meio surreal, mas interessante perceber que minha mente “meio consciente” era aparentemente capaz de escrever uma música, e eu achei essa experiência tão estranha, mas também inspiradora ao mesmo tempo, que você poderia dizer que aquele foi o ponto inicial no qual eu decidi basear todo o tema do álbum em torno da noite. Sempre tive, de fato, uma predileção pela Música Clássica. E “Chopin” é um dos compositores que mais me inspiraram, principalmente suas chamadas “peças noturnas” para Piano – os Noturnos. Vejo música, o metal incluído, mais ou menos como uma orquestração de elementos e/ou instrumentos diferentes, e cuidadosamente compostos, que criam uma certa imagem e vibração apenas quando consumados como um todo. Trabalhando muito em estúdio nos últimos anos, descobri que um instrumento pode soar muito bem e bonito quando tocado separadamente, mas se você está gravando álbuns, o que importa é a combinação de instrumentos e som no contexto da banda. Se você ouvir apenas as faixas da guitarra, nunca entenderá o todo, da mesma forma que se ouvir apenas os violinos de uma orquestra sinfônica, por exemplo. Esse tipo de abordagem clássica tem estado cada vez mais presente nas minhas composições ultimamente, embora não haja uma conexão musical direta com peças clássicas como os Noturnos de “Chopin”. Com o título do álbum “Noktvrn” eu só queria prestar uma espécie de homenagem ao grande compositor que foi “Chopin”.

A data de lançamento internacional do álbum está muito próxima agora (19/11/21), e nós estamos felizes por termos uma edição brasileira pela primeira vez, via “Mindscrape Music”. Vocês devem estar bastante empolgados pela estreia, bem como a turnê pela Alemanha, e os festivais internacionais do ano que vem…

Nikita: Honestamente, não sabíamos que havia um lançamento oficial brasileiro do álbum até agora! Mas isso é ótimo, de fato, e algo que não tínhamos tido até este momento, o que nos mostra que algo está acontecendo. Ficamos muito animados com isso, e esperamos que abra as portas para que algum dia venhamos a visitar o Brasil e a América do Sul para alguns shows, ou até mesmo uma turnê. Obviamente, esperamos que os poucos shows de lançamentos programados para este ano possam acontecer com os números da Covid-19 subindo novamente neste exato momento. Isso tudo nos mostra, mais uma vez, que estes tempos são tão incertos, e é difícil fazer planos adequados para o futuro. Estamos muito ansiosos pelas apresentações em festivais que confirmamos para o próximo ano e, claro, esperamos que a situação geral melhore, tornando os shows ao vivo possíveis e razoáveis novamente para todos.

A banda tem evoluído, estabelecendo a barra em um nível elevado, e lançando material novo que sempre supera ligeiramente o anterior em termos de qualidade. Isso é algo muito difícil de se atingir, qual é o segredo na sua opinião? Você também considera o “Noktvrn” o melhor material da banda até aqui?

Nikita: Escrever músicas nunca é um processo fácil. Você se questiona um monte de perguntas, e isso ocupa muito espaço emocional em seu cérebro e corpo. Às vezes me sinto um tanto vazio depois de terminar uma música, ainda mais um álbum novo completo, uma vez que a cada finalização desse processo, você deixa de lado algo que tem sido uma parte importante de você. Não é fácil, mas é muito recompensador. Às vezes parece até uma terapia. Eu realmente não tenho um plano mestre quando começo a trabalhar em um novo álbum. Às vezes parece que as músicas se escrevem por si próprias, comigo apenas sendo algum tipo de canal, que transforma as emoções em música e letras. “Noktvrn” é nosso álbum mais natural em termos de design de som e fluidez. Os elementos essenciais são basicamente todos os quatro membros da banda participando de forma equivalente no processo de gravação e produção, o que afinal, tornou o álbum nada mais que um prazer ao se criar. E acho que você pode ouvir isso mais do que nunca.

Como foi o processo de gravação do “Noktvrn”? Vocês lançaram um vídeo muito legal em 360 VR para a música “Monument”, tocando-a ao vivo no estúdio:

Nikita: O vídeo 360 VR é, na verdade, a melhor demonstração de como as sessões reais de estúdio ocorreram. Gravamos cada música exatamente na mesma situação de sessão ao vivo que você vê no vídeo. A única coisa que é diferente das músicas do álbum, é que os vocais foram dobrados mais tarde e só gravamos juntos os instrumentos ao vivo naquela sala. Portanto, as sessões de gravação diferiram bastante das gravações anteriores. Foi a primeira vez que cada membro da banda se envolveu no processo de gravação e produção como parte integrante e igual. Gravar cada música ao vivo, com todos em uma sala, tocando seu instrumento ao mesmo tempo, foi uma abordagem totalmente diferente e nova para todos. Foi necessária muita preparação e prática antes das gravações propriamente ditas, para que nós e as músicas ficassem na melhor forma possível até as sessões finais de estúdio, em março de 2021.Foi um processo bastante compacto e direto, que nos tomou apenas 12 dias até que o álbum estivesse totalmente gravado. Para todas as gravações anteriores, era basicamente apenas eu gravando todas as guitarras, baixo e vocais com a bateria tocada por “Tobias”, mas no final éramos apenas nós dois, e a maior parte da responsabilidade recaía sobre meus próprios ombros. Tendo gravado e produzido “Finisterre” (álbum anterior, lançado em 2017) quase sozinho, eu sabia que tinha que mudar alguma coisa. Com toda a turnê, e especialmente com o lançamento do nosso álbum ao vivo “Live in Berlin” (2019) nós percebemos o quão grande é a química da banda não só musicalmente, mas também em termos interpessoais, e então nos perguntamos: por que não usar isso para as gravações de estúdio também?

Como funciona melhor pra você em termos de composição? Você prefere trabalhar isoladamente, ou com outros membros da banda, como um time? A pandemia afetou a sua forma de escrever e compor de alguma forma?

Nikita: Mais uma vez, a composição especificamente ainda permanecia em minhas mãos. Porém, desde que comecei a escrever “Noktvrn” tive a ideia de gravá-lo posteriormente com toda a banda neste ambiente ao vivo. Isso significa que eu já tinha que ter certeza, no estágio de composição, em que a transições entre as partes e os riffs tivessem um fluxo natural, e as diferentes partes de bateria permitissem ao Tobias tempo suficiente para se recuperar, e ser capaz de gravar cada música inteira, do início ao fim. O mesmo para os vocais e todos os demais instrumentos, é claro. Basicamente, garantimos que as músicas não fossem muito difíceis de tocar, o que, por outro lado, nos levou a tocar apenas coisas que realmente somos capazes de fazer, focando apenas nas coisas importantes que a música realmente precisa. Não estou dizendo que os álbuns anteriores foram escritos de uma maneira que não possamos executá-los (obviamente estamos os tocando ao vivo), mas eles foram escritos para soar bem em uma gravação de estúdio, sem pensar muito sobre como soariam ao vivo. Isso deu às músicas uma vibe diferente já no estágio de composição, as tornou de certa forma mais compactas e, em última análise, mais acessíveis e fáceis de consumir (não de uma forma negativa). A pandemia tornou o agendamento de reuniões, ensaios e as sessões de estúdio reais um pouco mais difíceis, mas fora essas questões logísticas, todos sabem, não teve nenhum efeito na composição das músicas.

Foto por Vollvincent

Que tipo de atmosfera você procura criar, ou capturar, quando você está trabalhando na sua música?

Nikita: Vejo nossa música como uma espécie de canal, que ajuda as pessoas a se conectarem consigo mesmas, a se conscientizarem do que é importante, e a removerem todos os pensamentos, coisas tangíveis e obrigações desnecessárias. Pelo menos esta é uma das principais razões pessoais para mim, do porquê estou escrevendo, produzindo e tocando música. Vejo a nossa música como uma espécie de abrigo, uma companheira nos momentos de solidão, ao estar sozinho, quando é importante escutar a si mesmo. Claro, você também pode curtir nossa música com outras pessoas e, obviamente, há shows ao vivo com muitas pessoas em um só lugar. Mas gosto quando as pessoas fecham os olhos, e escapam para o seu próprio mundo – eu costumo fazer isso no palco também. Acho que nossa música tem a capacidade de pintar imagens em sua cabeça, e aprimorar a sua própria imaginação.

O álbum é definitivamente monstruoso, e alguns dos meus destaques pessoais seriam: “Morgen”, “Immortal” e “Gegen das Licht”, que é uma peça realmente épica, e emotiva. Você poderia nos contar um pouco mais sobre essas faixas? Eu sei que é uma pergunta muito difícil, mas você tem uma música favorita?

Nikita: Acho que todos na banda concordariam se eu dissesse que “Immortal” é a nossa favorita do álbum. Não só por causa da participação vocal como convidado do “THE DEVIL’S TRADE” (OBS: Projeto solo acústico de Dark Folk, de Dávid Makó), que é muito importante para nós, mas também porque há tantas coisas novas acontecendo nessa música. E eu fico muito feliz que as pessoas também gostem, e entendam a nova abordagem que queríamos experimentar com essa música. “Morgen” foi definitivamente a música mais desafiadora durante o processo de gravação. Especialmente o primeiro terço da música, que basicamente consiste em explodir sem parar, foi muito difícil para o nosso baterista “Tobias”, e ele precisou criar diferentes técnicas de percussão para poder tocar a música em um único take da forma mais perfeita possível. Vale o mesmo para o nosso baixista “Nicolas”, pois é uma das poucas músicas em que o baixo se torna um instrumento melódico, tocando não apenas as notas básicas simples, mas uma linha melódica sofisticada. Isso raramente acontece, pois a maioria das guitarras toca melodias e solos. Nessa música, pelo menos nos primeiros minutos quando os vocais começam, é tudo o baixo! “Gegen das Licht”, por outro lado, tem uma parte de introdução muito simples à primeira vista, mas na verdade, também foi extremamente difícil de gravar. Quanto mais tempo uma parte repetitiva é tocada, mais difícil se torna manter a dinâmica dessa parte, e mantê-la homogênea, porém ainda interessante. Com esta música basicamente consistindo em três partes diferentes, o desafio era encontrar o “arco de suspense” correto para tornar a música emocionante e cativante ao longo de todo o curso de mais de 11 minutos.

Falando sobre metal extremo, quais são algumas das suas influências mais importantes, e suas bandas e/ou artistas favoritos? Fique à vontade para também mencionar outros artistas em geral:

Nikita: No início, eu era muito inspirado pela música de bandas escandinavas de Black Metal como EMPEROR, DISSECTION e DIMMU BORGIR. Mas também pelo Black Metal alemão dos anos 90/00 como NAGELFAR, NOCTE OBDUCTA, ORLOG e HELRUNAR e mais tarde bandas como LANTLÔS, que para mim é um dos melhores exemplos de como uma banda de Black Metal pode evoluir no som sem perder sua identidade. Embora eles tenham se tornado um dos maiores artistas de Rock / Pop da atualidade, a banda MUSE tem sido uma grande influência para minha música também desde então.

O DER WEG EINER FREIHEIT tem estado ativo desde 2009, crescendo e se tornando mais relevante a cada novo lançamento. Quais são os elementos mais importantes para manter o som interessante, e seguir trazendo novos fãs a bordo após doze anos?

Nikita: Acho que uma das principais razões é que nunca paramos de criar, de tocar e não fizemos nenhuma pausa nos últimos 12 anos. Claro, há momentos em que vamos com mais calma, e pode parecer que não há muita coisa acontecendo. Mas, principalmente, há muitas coisas acontecendo nos bastidores que são invisíveis ao exterior. Já que não estamos trabalhando na banda em tempo integral, cada um tem seus próprios negócios para cuidar, então sempre queremos ter certeza de que não há pressão externa, e sempre temos o tempo de que precisamos para escrever um novo álbum, por exemplo. Nunca há um “você precisa”, e sempre tentamos deixar as coisas acontecerem naturalmente. O sucesso sempre depende do ponto de vista. Pode parecer trivial, mas é a coisa mais importante para começar: pergunte-se qual é a sua verdadeira motivação, e a razão pela qual você deseja escrever e tocar música. Eu comecei a escrever canções porque adoro criar música e adoro estar conectado à minha própria música ao tocá-la, gravá-la e ouvi-la. É um sentimento incomparável com qualquer outra coisa e este é o meu tipo pessoal de liberdade e sucesso. No entanto, essa também é a base para mantê-lo interessante e empolgante para os fãs, mesmo depois de todos esses anos.

Como é o seu relacionamento com o Metal Brasileiro? Você conhece, e curte alguma das nossas bandas?

Nikita:Para ser sincero, não sei muito sobre o Metal Brasileiro. Claro, todos nós conhecemos o SEPULTURA, mas tenho certeza de que há muito mais para descobrir! Há muitos anos, eu ouvia o KRISIUN de vez em quando, especialmente por causa de seu baterista. Acabei de colocar “AssassiNation” enquanto escrevo essas linhas, lembro que ouvia muito isso quando era adolescente!

Como você vê o DER WEG EINER FREIHEIT alguns anos adiante? O que você gostaria de alcançar com a banda, considerando o patamar onde vocês se encontram neste ponto, como uma das bandas líderes do Black Metal Avant-Garde? O contrato atual com a “Season of Mist” já está cumprido, ou podemos esperar por futuros lançamentos sob o selo?

Nikita: Um dos maiores objetivos com este novo álbum é chegar a países e territórios que nunca estivemos antes, como a América Latina e os Estados Unidos, por exemplo. Nós definitivamente continuaremos fazendo álbuns, mas não temos ideia de como eles vão soar! Cumprimos nosso contrato anterior com a “Season of Mist” com o lançamento de “Finisterre”, mas fizemos um novo para “Noktvrn” e mais outro álbum, pois achamos que essa gravadora é o lar perfeito para nós e nossa música.

Há planos para turnês futuras que incluam países Sul-Americanos? Seria incrível vê-los tocando ao vivo por aqui com uma ou duas outras bandas de suporte europeias, juntamente com algumas das nossas próprias…

Nikita: Seria incrível, de fato! Adoraríamos conhecer seu país, sua cultura e bandas. Nós definitivamente esperamos um dia por um tour! Como eu (Nikita) e “Tobias” estamos envolvidos na formação ao vivo da Banda Argentina de Black Metal “LOS MALES DEL MUNDO”, já existe um vínculo entre nós e a América do Sul e esperamos ter a chance de tocar no seu continente também com LMDM ou DWEF (ou ambos!) em algum ponto.

Muito obrigado pelo seu tempo e atenção, Nikita. Nós desejamos a vocês uma grande estreia e uma turnê bem-sucedida! Por favor, fique à vontade para deixar uma mensagem a todos os nossos leitores, seus fãs Brasileiros e da América do Sul em geral:

Nikita: Esperamos visitar o Brasil o mais rápido possível, sempre que for razoável viajar novamente por países e continentes! Mais uma vez, apreciamos muito todo o apoio que está vindo de seu país e agradecemos por dedicar seu tempo e fazer esta entrevista conosco.

Related posts

DEATH N´DARKNESS PREVAILS – em nome das raízes do metal negro

Fábio Brayner

CONVULSIVE – Mortos-vivos criando metal da morte em sua pútrida essência

Walter Bacckus

ARIMAN – A força do heavy metal Paraguaio

Walter Bacckus