Resenhar um lançamento de uma das suas bandas preferidas não é simples. É preciso suprimir o apego natural às obras favoritas, colocar de lado a memória afetiva e focar unicamente no material analisado.
Aos não familiarizados, o DEATHSPELL OMEGA (ou DsO) é composto atualmente por um trio – o fundador e guitarrista “Hasjarl” (membro do HIRILORN até sua ruptura), o polêmico vocalista e multi-instrumentista “Mikko Aspa” (CLANDESTINE BLAZE, STABAT MATER) e o baixista “Khaos”.
O Black Metal ortodoxo e pragmático do início da banda evoluiu, a partir de 2004, com o fantástico “Si Monvmentvm Reqvires, Circvmspice”. A partir daí, a sonoridade ganhou complexidade ímpar, expandindo em meio a dissonância extrema e aos temas ligados, principalmente, ao satanismo sob perspectiva da metafísica e de análises filosóficas.
“The Long Defeat” é o oitavo álbum de estúdio, e é anunciado pela banda como a “primeira emanação da terceira era do DsO”. Foi gravado ao vivo pelo trio em julho do ano passado, e conta com participações especiais de “Mortuus” (MARDUK) e “M.” (MGŁA, KRIEGSMASCHINE) nos vocais.
De fato, o disco de uma forma geral soa muito diferente de todo o material anterior. De uma forma ousada, arrojada e desafiadora (até aí, típico deles). Conceitualmente, o álbum gira em torno de três histórias interligadas, porém divergentes em suas narrativas, cada qual complementando e/ou contradizendo as demais. São elas: As Letras, uma Fábula e a Arte Gráfica (sendo, portanto, fundamental ter a mídia física em mãos pra conferir o conceito na íntegra).
Interessante e bem elaborado…pena que, do ponto de vista da música, a coisa não funciona tão bem e decepciona.
“Enantiodromia” é a bizarra faixa de abertura. Passados os cânticos de introdução, uma sessão atmosférica de guitarras esquizofrênicas se apodera do som, até a entrada dos vocais limpos (??) que declamam a letra… com mais ou menos seis minutos, as coisas soam um pouco mais como DsO. Instrumental caótico e dissonante. Mas desprovido de peso por um bom tempo. O extremismo é finalmente introduzido na reta final da faixa, mas o estrago está feito. Sujeira eletrônica ao final, um coral estranho… A impressão inicial não poderia ser pior.
“Eadem, Sed Aliter” começa prometendo, com um riff interessante mais característico. A tensão se desenvolve, vocais limpos voltam a declamar a letra. Enfim, temos a bateria atacando com blasts, eis o instrumental extremo. O ritmo médio prevalece, em meio a vocais que acredito serem do “Mortuus”, nova aceleração e a guitarra dispara um solo doentio, meio progressivo. Um segmento atmosférico denso e angustiante encerra a faixa.
“The Long Defeat” inicia lenta, com percussão simples, baixo marcante e guitarras criando uma parede de som totalmente dissonante. Ao menos, os vocais são extremos. Boa pegada e velocidade, com boas melodias agregadas ao caos, com ótimo efeito, criando o ponto alto do disco. A desaceleração é acompanhada de um coral sinistro, e funciona bem. Os dois minutos finais são atmosféricos e bem introspectivos.
“Sie sind Gerichtet!” abre e segue em alta velocidade, até que um rápido solo sinaliza uma desaceleração brusca, onde uma percussão extravagante chama a atenção, marchando entre riffs atonais que rumam em direções opostas e se digladiam, criando uma atmosfera caótica com a assinatura do DsO, e dominada pela pulsação do baixo de “Khaos”.
Após um tsunami de surpresas e espanto, temos “Our Life is your Death” encerrando o álbum. A atmosfera é interessante, mas os vocais não ajudam. A faixa caminha oscilando entre ritmos lento e médio, mas tudo soa muito limpo. Limpo demais para um álbum do DsO. Faixa ruim de doer, inofensiva.
Aparentemente, a banda optou por trilhar, a partir daqui, um direcionamento semelhante ao de bandas como o BEHEMOTH (POL), muito mais acessível. Também é muito mais melódico e atmosférico, absorvendo influência de atos como “MGŁA”, “UADA” e “BATUSHKA”.
É o primeiro álbum da discografia que considero abaixo da média, um tanto frustrante considerando a qualidade soberba da discografia até aqui. São poucos bons momentos perdidos entre os 44 minutos do Play. Pensando bem, poucas vezes o título de um disco fez tanto sentido.
Não recomendo, infelizmente. Àqueles que tiverem a curiosidade de conhecer o auge da banda, que é espetacular, sugiro os álbuns da trilogia satânica: “Si Monvmentvm Reqvires, Circvmspice”, “Fas – Ite, Maledicti, in Ignem Aeternum” e “Paracletus”, além dos EPs lançados na mesma época (como o “Kénôse”, por exemplo). O álbum anterior ao atual, “The Furnaces of Palingenesia” também é excelente.
Tracklist abaixo, duração total de 44:11 minutos:
1 – “Enantiodromia”
2 – “Eadem, Sed Aliter”
3 – “The Long Defeat”
4 – “Sie sind Gerichtet!”
5 – “Our Life is your Death”