Melancolia, luto, paixão e conforto. O The Old Coffin Spirit Zine teve o prazer de conversar com o prolífero e talentoso músico/compositor chileno, Sergio Gonzalez Catalan — a mente criativa da Rise Tho The Sky. Falamos sobre Doom Metal, cena chilena e brasileira, projetos futuros, composições e sobre seu mais recente lançamento “Per Aspera Ad Astra”. “Não há nenhum outro motivo para a criação deste trabalho, cada nota neste álbum reflete o meu pesar.”
Bem-vindo ao Old Coffin Spirit Zine/Portal e obrigado por aceitar o nosso convite. Gostaria que você nos contasse um pouco sobre a criação da Rise To The Sky, bem como suas motivações e influências.
Sergio Gonzalez Catalan: Rise To The Sky é um projeto solo de Doom Metal de Santiago, no Chile. Minha música é sobre perda, luto e morte romântica, essas são as coisas que me inspiram e eu tento ilustrá-las em melodias e sons. Eu quis criar uma banda para tocar a música e os sons que eu realmente amo. Solos de guitarra, harmonias, vocais rasgados, arranjos orquestrais e pedal duplo, é disso do que a minha música se trata.
Peso épico, grandes atmosferas, profundidade, complementos sinfônicos e melancolia. Bem, nós estamos na era dos rótulos — de bandas sendo catalogadas e sons sendo enquadrados em gêneros e subgêneros. Como você definiria o som do “RTTS”?
Sergio Gonzalez Catalan: Eu concordo totalmente com o fato de que estamos vivendo a era da categorização. Muitas pessoas rotularam minha música como Melodic, Funeral, Atmospheric ou simplesmente Death/Doom Metal. Eu estou de boa com todos estes rótulos, desde que eu também possa identificar vários elementos destes subgêneros nas minhas músicas ou álbuns. Recentemente o zine A Certain Taste rotulou a minha música como “Grief Death/Doom”, que eu penso que descreve a minha música perfeitamente, uma vez que ela é sobre perda. Sonoramente falando, eu tenho tentado expressar isto ao usar atmosferas melancólicas junto de algo como um clima revigorador ao mesmo tempo.
“One-man bands” são muito comuns — tanto no Black Metal quanto no Doom Metal, onde nós temos nomes como Doom:VS, Sorrowful Land, Nortt, Forest Shadows, entre outros. Quais são os prós e contras de se trabalhar sozinho? Você já considerou começar uma banda de maneira tradicional, dividindo funções e recebendo colaborações no processo criativo?
Sergio Gonzalez Catalan: Para mim, de longe a maior vantagem de ser um one-man band é a absoluta liberdade criativa que isso proporciona. Como um one-man band, eu posso compor e tentar o que eu quiser, quando eu quiser, e também posso trabalhar por muitas horas e sem um horário particular, o que me permite investir todo tempo que eu posso na música. Há também uma troca no processo criativo, uma vez que faltam sinergias que surgem do talento particular de cada membro de uma banda completa. No entanto, eu sempre tento melhorar a minha composição, e eu geralmente colaboro e debato sobre muitos detalhes da minha música com meu produtor, Filippos Koliopanos, que também é um prolífico compositor e músico.
De sua criação até agora, a banda soma dois EP’s: “In The Grave Of A Forgotten Soul” e “A Cold Embrace From Life” (ambos lançados em 2020) e três registros completos: “Moonlight” (2019), “Death Will Not Keep Us Apart”(2020) e “Let Me Drown With You” (2021). Conte-nos um pouco sobre o “making of” de cada um deles e quais são as diferenças entre eles.
Sergio Gonzalez Catalan: “Moonlight” foi meu primeiro álbum. É uma jornada experimental e tem um som muito diferente dos meus outros lançamentos. Eu encontrei a minha voz verdadeira no EP “In The Grave Of A Forgotten Soul” depois de experimentar diferentes estilos. Eu escrevi “Death Will Not Keep Us Apart” enquanto viajava para longe dos meus entes queridos, ela fala sobre um sonho que eu tive sobre um casal que encarava a morte iminente juntos, musicalmente falando ele tem um som melódico que combina muito com vocais limpos e rasgados. “A Cold Embrace From Life” é um dos meus trabalhos mais sombrios e foi feito para alguém que não conseguiu ver este mundo. “Let Me Drown With You” é minha abordagem com o Funeral Death/Doom Metal. Naquela época, eu usava apenas vocais rasgados e estava numa vibe muito “romantic death”, eu quis fazer um álbum sobre amor durante tempos difíceis e quis que ele refletisse os sacrifícios que as pessoas fazem por seus entes queridos. “Per Aspera Ad Astra” é puramente sobre a perda, dor e luto. É um álbum sobre a morte de uma pessoa amada, o que é algo muito comum, de uma maneira que quase toda pessoa irá experimentar este tipo de perda em algum ponto de sua vida. E eu quis expressar uma ideia de ver alguma luz durante a escuridão do processo de luto.
No dia 3 de setembro foi lançado “Per Aspera Ad Astra” — seu quarto álbum e segundo apenas nesse ano. Como foi o processo de composição do mesmo?
Sergio Gonzalez Catalan: Eu o escrevi devido à morte do meu pai em janeiro de 2021. Foi emocionalmente exaustivo. Foi algo tão inesperado e chocante que deixou toda a minha família de cabeça para baixo. Eu lembro de ter que lidar com os preparativos para o funeral, escrevendo cartas, obituários e todos os tipos de papelada de um momento para o outro. E eu não conseguia acreditar no que tinha acontecido, é difícil para mim acreditar até hoje. De alguma forma eu tive que seguir em frente com a minha vida como se nada tivesse acontecido, porque eu tinha muitas responsabilidades e eu não fui capaz de parar nem por um momento. Por dentro, eu sentia que estava morrendo, então eu encontrei o meu conforto na música e tive o meu luto através do álbum. Não há nenhum outro motivo para a criação deste trabalho, cada nota neste álbum reflete o meu pesar.
“Per Aspera Ad Astra” conta novamente com a produção, mixagem e masterização de Filippos Koliopanos (Ocean Of Grief/On Thorns I Lay). Como vocês se conheceram e como ocorreu essa tão duradoura e prolífera parceria?
Sergio Gonzalez Catalan: Nossos caminhos se cruzaram por acaso. Conheci o Filippos online enquanto pesquisava sobre alguém que mixasse/masterizasse meu álbum “Moonlight”. Trabalhamos naquele álbum, as coisas se encaixaram e nós nos tornamos amigos. Começamos a colaborar, a trocar ideias e ele se tornou meu produtor. Hoje eu não consigo me ver fazendo alguma coisa na minha música sem a ajuda dele. Ele também é um grande músico e compositor, então, ele é realmente uma ótima pessoa para se trabalhar junto.
Ainda sobre o novo álbum, ele dá sequência à sua parceria com o selo russo GS Productions (GSP Magazine). Como surgiu a oportunidade de trabalhar com eles? Você se sente satisfeito?
Sergio Gonzalez Catalan: A GSP me deu suporte desde o começo, eu os procurei porque meu produtor (Filippos) já tinha lançado um EP com sua banda no passado e teve uma boa experiência com eles. A GSP é conhecida por ser um selo de muito alta qualidade, constantemente lançando música nova e encontrando novos talentos no underground. A GSP é um grande selo na minha opinião. Vitalmente, o dono apoiou todos os meus lançamentos e se certificou de prensar os CD’s na qualidade que eles mereciam. Eu não poderia pedir por mais.
Ouvindo os singles “Life In Suspense”, “End My Night” e a faixa-título, nós notamos que a qualidade das composições continua aumentando. Estes singles também revelam não apenas a sua evolução como compositor, mas também, sua meticulosidade e preocupação com os arranjos e detalhes. Você se considera um perfeccionista ou até mesmo um “workaholic”?
Sergio Gonzalez Catalan: Eu tentei aperfeiçoar meu estilo e som com cada lançamento. Eu sempre recebo muito feedback de ouvintes e resenhistas e eu tento incorporar tudo que faria minha música melhor. Sou muito perfeccionista e exigente quando se trata do som certo. Ouço as músicas centenas de vezes, e eu não tenho medo de fazer todas as mudanças necessárias quando é preciso. Felizmente, o Filippos divide a mesma filosofia comigo, então geralmente fazemos tudo o que precisamos para obter o som adequado. Quando se trata de trabalho e composição, música requer grande dedicação e devoção. Amo fazer música e eu não me importo de passar todo o meu tempo trancado no meu estúdio fazendo-a.
Você recentemente anunciou um novo projeto, Winds Of Tragedy, ainda ligado ao Doom Metal, mas combinando-o com Atmospheric Black Metal. O que mais pode ser dito sobre esta “quase” nova aventura? O que motivou você a criar este projeto paralelo e o que podemos esperar dele?
Sergio Gonzalez Catalan: Winds Of Tragedy é um projeto que saiu do meu amor por blast beats. Eu estive escutando bastante Atmospheric e Post-Black Metal recentemente, e eu simplesmente amo isso. Eu estou terminando meu debut com este projeto, e eu posso dizer que ele terá um som agressivo que incorpora muitas das melodias que eu amo, e também o estilo vocal que eu tenho desenvolvido com o Rise To the Sky.
O Chile tem uma representação gigante quando se trata de Doom Metal: Poema Arcanvs, Mar De Grises, Lapsus Dei e Uaral são apenas alguns (grandes) exemplos da força e qualidade que as bandas chilenas possuem. Como o cenário de Doom Metal funciona no Chile? As bandas se apoiam? Há união entre elas?
Sergio Gonzalez Catalan: Estas são todas grandes bandas, pelas quais eu não tenho nada além de um imenso respeito. Pessoalmente, eu tento apoiar todas as bandas chilenas de Doom Metal que eu conheço. Recentemente, eu comprei a reedição do LP “Draining The Waterheart” do Mar De Grises, que é uma obra-prima. Eu geralmente converso e compartilho pensamentos, bem como colaboro com algumas bandas de Doom Metal do Chile e há também uma forte cena de ouvintes apoiadores do Metal no país.
Todos nós, fãs, temos nossos álbuns do coração, nossos álbuns de cabeceira — os nossos favoritos. Quais são os seus dez álbuns favoritos e por quê?
Sergio Gonzalez Catalan:
01. Celestial Season — “Solar Lovers”. É o meu álbum favorito de Doom Metal hoje. Bateria perfeita, atmosfera impecável, simplesmente perfeito de todas as maneiras.
02. My Dying Bride — “The Dreadful Hours”. O primeiro álbum que eu ouvi do “MDB”, explodiu minha mente quando eu o escutei.
03. Amorphis — “Tales Of A Thousand Lakes”. Som lindo e clássico.
04. Shape Of Despair — “Angels Of Distress”. Uma grande inspiração.
05. Type O Negative — “Life Is Killing Me”. Me ajudou a passar por uma separação dolorosa quando eu era mais jovem.
06. Funeral — “Oratorium”. Uma das minhas bandas favoritas, musicalmente é muito sofisticada.
07. Before The Rain — “One Day Less”. Isto é exatamente como o Doom Metal soa. Baterias e guitarras entoam tristeza e dor.
08. Woods Of Ypres — “Pursuit Of The Sun & Allure Of The Earth”. É uma obra-prima na minha opinião. O Uso de instrumentos acústicos e vozes é simplesmente soberbo.
09. The Fall Of Every Season — “Amends”. Essa one-man band me deixou “hypado” para começar o meu próprio projeto.
10. Ocean Of Grief — “Nightfall’s Lament”. Talento imenso e inspiração enorme para tudo que eu escrevo.
E já que estamos falando sobre bandas e álbuns, o que você conhece de Doom Metal brasileiro?
Sergio Gonzalez Catalan: Eu conheço e ouço a Soulsad, o The Aberration Of Doom e o Coldwinter. Eu também sigo o trabalho do Jupiterian e Helllight, que são tremendas bandas. Recebi algumas ofertas para colaborar com músicos brasileiros de Doom Metal, mas não aconteceu ainda, uma vez que estive ocupado demais com a Rise To The Sky e o Winds Of Tragedy. Talvez no futuro aconteça.
Apesar de todas as dificuldades causadas pela pandemia, a cena mundial do Doom Metal está vivendo um dos seus melhores períodos em muito tempo. Vide o enorme fluxo de lançamentos de novas bandas e também de bandas já estabelecidas. No entanto, no meio de tantos lançamentos, nós também temos muitos registros genéricos e desinspirados. Para você, o que é Doom Metal e como você pode criar um álbum bom e honesto que se destaque dos demais neste imenso mar de repetições e cópias?
Sergio Gonzalez Catalan: Na minha opinião, Doom Metal é simplesmente puro feeling e ele precisa transmitir aquelas fortes emoções para o ouvinte. Se há problemas com o som geral ou os vocais, alguém deve prestar atenção e focar no que é importante de verdade, que é aproveitar a atmosfera e o poder do Doom Metal. Quando se trata de gênero, ele é caracteristicamente mais lento que qualquer outro tipo de música, mas eu acho que ninguém deve pensar muito sobre se encaixar em um gênero particular, destacar um instrumento ou talento particular, mas conseguir transmitir aquelas emoções e sentimentos através da música. A música e a mensagem geral são o mais importante e isto é o que deve prevalecer.
Muito obrigado pelo seu tempo e paciência. Esperamos que o novo álbum seja bem recebido tanto pela crítica quanto pelos fãs (algo que já é certo). Deixe uma mensagem para os fãs e para aqueles que estão conhecendo por esta entrevista.
Sergio Gonzalez Catalan: Eu só gostaria de agradecê-los pela oportunidade de conversar com vocês e expressar estas ideias sobre a minha música. Para os meus ouvintes, eu só tenho palavras de agradecimento pelo grande apoio e pelo interesse pela minha música. Por favor, não hesitem em me procurar nas redes sociais, eu sou sempre grato por receber suas mensagens e conversar com vocês sobre música. Stay Doom!
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