Entrevistas

GIOVAN DIAS – Folhas subversivas, alfarrábios do Underground e uma luta incessante pela música do subterrâneo

O movimento underground não vive só de bandas, de músicos, selos/distro e produtores de eventos, e a imprensa é parte importante dessa engrenagem. Temos a imprensa mainstream, existem hoje também web-zine e os fanzines impressos que é a parte importante disso tudo. E hoje vamos bater um papo com o batalhador Giovan Dias, editor de zine, que faz parte também dá staff da Lucifer Rex e grande conhecedor da cena de Salvador.(BA) Direto da terra sem salvação, o nosso amigo nos fala um pouco de sua história no submundo.

Saudações Giovan Dias. É uma honra fazer essa entrevista com você meu amigo. Seja bem-vindo ao The Old Coffin Spirit Zine & Portal. Sei que você está com problemas de saúde e espero que tenhas melhorado. Para iniciarmos gostaria de saber como você descobriu o Rock/Metal em sua vida e o que mudou a partir desse mergulho no submundo.

Giovan Dias: Salve grande Walter! A honra é minha em trocar essa ideia contigo para um zine que tenho grande apreço como o The Old Coffin Spirit.  Sim, como dizem, a conta chega, mas aos poucos estoub superando essa fase. Cara, o rock foi desde a infância, mais como um fator de curiosidade por aquele estilo diferente do que ouvia na rua em tempo de moleque e pelo que a Globo me deixou assistir do Rock in Rio de 85. Então ao lado de Balão Mágico,  Trem da Alegria, Os Abelhudos eu já ouvia Titãs,  Legião, Paralamas, Camisa de Vênus,  kkkkkkkkk…Mas tudo mudou foi no final de 89 quando um amigo me falou de uma banda que as capas eram cheias de caveiras e totalmente satânica. Aquilo me chamou muita atenção,  pois já era muito interessado pelo tema e por filmes de terror como A Hora do Pesadelo e A Morte do Demônio. Então fomos numa loja de discos chamada ” A Modinha” e ao lado de lps de Agepê, Chiclete com Banana,  Michael Jackson, Cid Guerreiro entre outros, me deparo com o Sevent son Of Seventh Son do Iron Maiden! Ali foi a devirada de chave, passei o ano de 1990 ouvindo esse LP com uma toalha amarrada na cabeça e uma vassoura como guitarra (hahahaha). Um ano depois já estava ouvindo Sepultura,  Viper, Megadeath,Nasty Savage, Black Sabbath, Wasp…em 92 o Metal Extremo entrou na minha vida com Venom, Celtic Frost, Sarcófago,  Mystifier…a partir daí nunca mais fui o mesmo!!!!

Sabe porque eu adoro fazer essa pergunta sobre quando a pessoa descobriu o Rock/ Metal? Exatamente por esse tipo de respostas. Se fosse lá em 1988 ou início dos 90, você seria morto e na lápide os “true” escreveriam: Death to poser!(HaHa). Naquela época os Metalheads não ouviam esse tipo de bandas ou ouviam escondido. Eu peguei o finalzinho do Balão Mágico e era apaixonado pela Patrícia Marx do Trem da Alegria. Mas enfim, você lembra dos primeiros shows no submundo que frequentou?

Giovan Dias: Hahaha….se fosse naquela época eu ia mentir!!! Diria que nasci ouvindo Hellhammer!!! Que fui batizado num ritual satânico ao som do Vulcano!!! Mas tudo é questão de maturidade,  são fases e éramos muitos jovens em buca de um lugar ao sol, ou melhor, no inferno…hehehe Não tem como esquecer né? É marcante na trajetória de qualquer headbanger! Cara, por coincidência essa semana resgataram o vídeo do primeiro show  que fui…foi provavelmente em setembro de 92, Slavery e The Cross! Foi simplesmente foda! Quando desci as escadas do local e me deparei com aquela cena, um monte de headbangers batendo cabeça,  dando mosh e degradando, pensei: “isso é Infernal! E eu gosto disso!”….aí durante 92 à 94 lembro dos primeiros shows..vi Slavery e The Cross inúmeras vezes   além de Chemical Death, Mystifier,  Innoculation,  HeadhunterDC, Obliteration, Malefactor, Blackness, Crucificator, Mercy Killing, Zona Abissal, Infamous, Necrolust….The Mist, Ratos de Porão,  Tempestas apareceram nessa época por aqui também.

Pois é, era outra época, outros tempos e que bom que as coisas mudaram um pouco. Nos grandes centros era muito radicalismo e rolava muita briga entre bangers e também contra punks, carecas e skinheads. Mas segundo relatos de amigos e contatos que tenho na Bahia, me falaram que a cena na terra sem salvação não era fácil. Nos conte como era a cena nos anos 90 em Salvador, a “terra de todos os demônios”?

Giovan Dias: Sim , não é lenda não,  a cena de Salvador era extremamente radical e com muitas tretas. Quando cheguei ainda existiam muitos Punks e Carecas. A treta maior era com os Carecas. Presenciei muita pancadaria, tiros e fiquei muitas vezes na porta do local do show, esperando amanhecer para ir pra casa, já  que os Carecas ficavam na principal estação de ônibus do centro aguardando os bangers! Era foda! Já com os punks havia uma certa aproximação, mas era uma relação “por um fio”. Ao mesmo tempo que estávamos num mesmo local, cada um  no seu canto, seja em shows ou lojas, em qualquer instante podia rolar uma briga. Os punks da  “Vermes do Sistema” eram bem encrenqueiros. Os Carecas e Punks foram reduzindo com o passar do tempo, uns morreram,  outros viraram crentes ou “cidadãos comuns”…Em paralelo rolava a violência dentro do Metal Extremo que se prolongou até pouco tempo atrás …o Black Metal de Salvador sempre levantou a bandeira do radicalismo extremo e se criou, mesmo que inconsciente, um círculo interno de difícil acesso. Aqueles que tentavam fazer parte precisavam ter sorte e sangue nos olhos. Ir a um show de Black Metal em Salvador, principalmente nos anos 90 não era para qualquer um. Se você fosse desconhecido naquele local, possivelmente não sairia ileso. Presenciei muito sangue escorrendo em diversas oportunidades. Tive também meus problemas, principalmente nos anos de 92/93, mas segui em frente onde muitos desistiram no caminho.

Pois é, era outra época, outros tempos e que bom que as coisas mudaram um pouco. Nos grandes centros era muito radicalismo e rolava muita briga entre bangers e também contra punks, carecas e skinheads. Mas segundo relatos de amigos e contatos que tenho na Bahia, me falaram que a cena na terra sem salvação não era fácil. Nos conte como era a cena nos anos 90 em Salvador, a “terra de todos os demônios”? Uma mentira, virar crente, é pior é sair de cena dando calote em um monte de gente séria. Como você vê esses posers ou “false metal” ?

Giovan Dias: Esse radicalismo, como você mesmo diz inconsciente, foi fruto de uma época de imaturidade, descobertas e tentativas de conquistar um “lugar ao sol”. Hoje, os que continuam no underground, pensam diferente ou certamente tem uma ideia diferente sobre a violência muitas vezes gratuita da época, que hoje vemos as consequências. Shows muitas vezes vazio, uma cena envelhecendo e não se renovando.  Quanto a contradição que você fala, acho que  contradição mesmo seria servir a dois deuses. No sábado está adorando a Satã e no domingo pedir perdão a Je$$us.  Tenho pensado de outra forma ultimamente, e analiso que isso é um ato comum e puramente do ser humano. Mudanças,  transformações e a busca do que melhor lhe convém.  Se num dia você quer guerra, e no outro já sonha com a paz , entregue suas armas, retire sua farda e não olhe para trás.  Pior é viver de mentiras e enganar as pessoas a sua volta.  Sobre os tal “false metal” é o caráter que predomina. Ao invés de sair de cabeça erguida daquele estilo de vida que não mais lhe provém, preferem jogar o  nome na lama, destruir uma trajetória conquistada e pior, prejudicar muitas vezes pessoas que durante anos os consideram como amigos.  Vejo acontecer sempre…às redes sociais não perdoam os rip-off.

Depois que você descobriu  o Metal e o submundo, o que já que é algo que todo Metalhead queria fazer, era fazer parte da cena. Você chegou a montar alguma banda?

Giovan Dias: Verdade…quando logo depois que ouvi aquele álbum do Iron Maiden meu sonho era ter uma banda de Metal!! Divagava em pensamentos e escrevia letras horríveis, pensava em nome pra banda…Rsrsrs…até que concluir que seria  Putrefy! Mas era moleque demais e ficava tudo na matéria da vontade. A vontade real de fazer parte da cena foi entre os 16/17 anos, quando fui aprender a toca baixo com o líder da banda Slavery. Lá conheci um cara e juntos firmamos essa parceria de fazer banda, mas como conversamos antes, foi mais um que desistiu no meio do caminho. Tempo depois, soube que a banda de Death Metal INFAMOUS estava procurando baixista, pois Luis Angelkiller, vocal e baixo, ficaria apenas no vocal. Pra quem não sabe, Angelkiller é irmão de Sérgio Ballof da HEADHUNTER DC e e um dos guitarristas da INFAMOUS era o Fábio Nosferatus que pouco tempo depois viria a tocar por anos na HEADHUNTER DC  e hoje toca na BASTARD.  Então, cheguei a ensaiar umas duas vezes com a banda no saudoso estúdio de Vangel, onde a grande maioria de  bandas de Death Black ensaiavam. Entretanto, logo em seguida precisei sair por problemas pessoais, uma namorada engravidou e a cabeça pirou, acho que não tinha nem 18 anos. A banda também não durou muito e naquele mesmo ano acabou.

Depois disso esqueci o assunto banda, pois percebi o comprometimento que você precisa ter,  principalmente com os outros integrantes,  e era algo que não conseguiria honrar devido aos estudos e tudo mais que estava rolando em minha vida.

Depois que você descobriu  o metal e o submundo, o que já que é algo que todo Metalhead queria fazer, era fazer parte da cena. Você chegou a montar alguma banda?

Giovan Dias: Sim, pura verdade. Eu já havia colocado na cabeça que com banda não ia rolar, principalmente pelo comprometimento que citei antes. Se quisesse fazer parte teria que ser algo individual, ou pelo menos sem cobranças. Foi quando, por esse período, bateu na minha porta dois amigos; O André Luiz e o Júlio César me convidando para fazer um zine. Literatura foi algo presente na minha vida desde a tenra idade, então aquele convite foi muito mais que bem vindo, pois já acompanhava  trabalhos como The Black Book Zine, Deusdemoteme Zine, Unholy Contract Zine, Abstract Funeral Zine, ,Medical Genocide Zine…Naquele momento estava-se fecundando um embrião literário com teor maligno. Naquela tarde estava ouvindo a DT do ANCIENT SIGN GLORIFY e uma fita com a gravação de um lançamento vindo da Europa, que era o “Prophecies Of Pagan Fire” do ENTHRONED e a partir da influência destes títulos foi batizado o Zine THE GLORY OF PAGAN FIRE.

Pois é, todos nós queríamos fazer parte da história e ajudar o submundo de alguma forma. Lembro que lá em 1995 eu e meu amigo Jeff Menzen queríamos montar uma banda e montamos a “Dark Souls”, e caiamos na realidade que não era a nossa ser músico e, na verdade, tinha que ter muito tempo de estudo e dedicação, abortamos a banda após um ano de ensaios na garagem. Ficamos muito tristes e até que na mesa de um bar bebendo vinho barato o Jeff veio com a ideia de montar um zine e assim saiu o Azathoth zine, que lançou duas edições, nos anos 90, (1996/1999) e eu ajudava na divulgação e algumas entrevistas.  Quais foram suas influências literárias e você espelhou – se em algum outro zine para montar o “The Glory Of Pagan Fire Zine” e que ano você lançou a primeira edição? 

Giovan Dias: Influências foram realmente os zines que citei anteriormente, houveram outros, mas realmente não lembro mais os nomes. Entre esses acho que o Medical Genocide Zine foi minha principal influência! Em 2019 foi lançado uma nova edição do Medical Genocide Zine depois de quase duas décadas, mas acredito que sem pretensões de um retorno regular. Há pouco também foi lançado um livro especial com todas as edições de 1991 a 2019 pela editora Blackhearts. Quanto ao lançamento do meu zine, após muita batalha e trabalho, uns 15 meses depois entre 96/97 lançamos a primeira edição do THE GLORY OF PAGAN FIRE ZINE com uma entrevista exclusiva com Nornagest do ENTHRONED entre outras como SARGATANAS, MALKUTH,  MALEFACTOR…fiz uma página no Facebook e criei uma pasta com fotos da primeira e segunda edição feitas entre esses anos de 97 e 99.

Pois é, você lançou duas edições em 1997 e 1999 e depois disso o T.G.O.P.F.Z. se recolheu em uma tumba fria e escura, e adormeceu por um longo período de tempo,né? O que houve por você retirar esse grande artefato do submundo?

Giovan Dias: Sim, foram longos anos. Quase 15 anos. Hoje lendo as diversas entrevistas com bandas em zines e sites, vejo o quanto é comum o que aconteceu comigo e em minha trajetória. Não acontece com todos, mas com muitos chega um momento que é preciso parar e reorganizar a vida. No meu caso  na verdade, desorganizei mais ainda e fui até onde chamamos fundo do poço. Drogas, álcool, depressão,  casamento,  filhos … .foi um liquidificador de acontecimentos no qual tive que deixar as atividades do submundo para último plano. Em 2001 fui morar por motivos de trabalho no Rio de Janeiro, me enterrei  no trabalho e aos finais de semana continuava fazendo merda. Depois em 2007 fui morar em Campinas (SP) também à trabalho e a vida  de destruição continuava. Retornava para Salvador umas 4 vezes no ano para ver os filhos, mas me isolei do Metal. Acompanhava os acontecimentos pelo Orkut e My Space , e só. Lá para 2010 já estava novamente com a cabeça no lugar e retornando definitivamente para Salvador.  Lembro que cheguei na semana do show do Benediction e foi foda rever velhos amigos! Fui abraçado mais uma vez pelas trevas!!! Passou-se o tempo e mais uma vez aquela vontade louca de contribuir com  nossa cena extrema voltou, pensei em comprar um baixo novamente e voltar a tocar, porém pensei melhor e desisti.   Contudo,  “o que está morto não pode morrer,  mas volta a se erguer, mais duro e mais forte”. E assim foi que saímos do abismo em 2017 lançando a terceira edição.

Neste novo retorno de 2017, li a resenha em algum fanzine do submundo que chegou em minhas mãos e entrei em contato contigo, porém de modo diferente, através de whatsapp já que vinha o seu número na resenha. Época  diferente dos anos 90, em que o contato era por missivas e correio, e demoraria uns três meses até ter o vosso trabalho em mãos. Mas enfim, como foi a recepção desse retorno do zine pelas criaturas das trevas do submundo metálico em 2017 e  já  estávamos vivendo em um mundo digital e poucas pessoas valorizam o material físico e impresso?

Giovan Dias: Verdade, tudo facilitou bastante nos últimos anos. Acabou aquele sofrimento de meses e meses de espera por uma resposta da qual nem sabíamos se iria chegar ou não. Acho que se fosse atualmente  teríamos ainda mais crises de ansiedade por isso! Hoje a entrevista, em muitos casos, é praticamente em tempo real através do Whatsapp ou skype. Quando retornei em 2017 tive uma boa recepção sim, alguns amigos já me cobravam esse retorno e estava bastante empolgado em voltar à ativa. Foi um pouco estranho, até pegar a velha rotina novamente, foi como dirigir um Corolla após viver anos dirigindo um Fusca, a gente sente a diferença, mesmo que para muito melhor! Tem que ir com calma.  Cara, os zines impressos foram os pilares da cena underground! Foi por eles e através deles que tudo transitou e as bandas foram sendo conhecidas em todos os cantos do Brasil, numa época em que só tínhamos a escrita como forma de divulgação do underground. Falo de underground e não do mainstream que já havia a Rock Brigade, por exemplo, como grande divulgador. Mas é o que disse antes, também. A cena envelheceu e não houve muita renovação, juntando com uma nova era, onde a globalização e o mundo digital surgiram para mudar tudo à nossa volta, os zines impressos foram esquecidos por muitos!  Percebi que a grande maioria das pessoas que me procuraram foi zineiros e a velha guarda que viveu os anos 90 e início dos anos 2000. Os zineiros fundamentalmente mantém essa arte viva, não só lançando novas edições, mas também fazendo sempre trocas e aquisições. Hoje o zine impresso é mais de zineiro para zineiro, tirando algumas exceções.   Para piorar a situação, vivemos numa época em que imagens e vídeos são mais procurados do que uma leitura.  É mais rápido, mais prático , embora muitas vezes com muito menos conteúdo. Enfim, novos tempos em que batalhamos muito para manter essa arte da escrita subversiva viva.

Em 2020, você lançou a segunda edição dessa volta de seu fanzine,né ? Como você escolhe as bandas que farão parte do zine ? Existem alguns critérios para uma banda sair nas páginas do fogo pagão ?

Giovan Dias: Na verdade, a segunda edição de retorno, ou quarta edição, como queira, foi em 2018.  Em 2020, no início da era pandêmica lancei a última edição e foi a mais difícil de divulgar, devido a pandemia. Correios fechados ou os que estavam abertos eram distantes da minha casa,  copiadoras fechadas, falta de material básico às vezes para imprimir…vários fatores, até mesmo falta de grana do pessoal ou estarem focados em toda preocupação e caos que a pandemia ocasionou. Já se vão 3 anos desde a última edição. Então, o critério essencial desde o primórdio é : nada de White Metal ou de NS. E acho que é algo que predomina entre todos nós!  Passando essa etapa até a quarta edição tive um mix de critérios: Relação próxima ou de amizade com as bandas para dá uma força na divulgação das mesmas  (Natas, Bastard, Ad Baculum, Morbid Perversion), curiosidade sobre a banda e querendo assim, conhecer mais sobre a mesma  (Creptum),   bandas que considero e tinha o interesse de trocar uma ideias (Eminent Shadow, Vobiscum Inferni, Slaugtbbath) e por fim bandas que fizeram parte da minha trajetória e que tenho grande respeito e admiração (Root).  A quinta edição na verdade também seguiu esse critério, apesar de ter 99% de bandas/hordas de essência totalmente diabólica e voltada ao Black Metal.

Pois é, para o mainstream sempre existiu mais apoio, até porque existem revistas especializadas como a já citada: Rock Brigade nos anos 80, 90 e no início dos anos 2000, ela sumiu de circulação. E no final dos 90 surgiu a Roadie Crew que está na ativa até hoje entre outras como a Valhala que lançou algumas edições. Até porque essas revistas e o mainstream estão mais preocupados com lucros do que com amor e respeito, e suor que os fanzineiros tem pela arte Underground. Até tenho uma teoria que essas revistas criaram uma geração que não tem conteúdo e atitude tão importante que o submundo precisa e sempre teve. Essas revistas criaram uma geração que só está preocupada com a técnica e sem os pilares que existem dentro do submundo. Mas enfim, é outra época e segue o baile. E quando sairá a nova edição do The Glory Of Pagan Fire Zine?

Giovan Dias: Cara, as revistas que circulavam nas bancas e a que até hoje sobrevive, só estão aí devido ao lucro, é óbvio! Não tem nem o que discutir. A engrenagem é dessa forma! Ninguém vai investir uma boa grana e dizer que é por amor ao Metal, a não ser que esteja sobrando dinheiro….o cara faz até uma ou duas tentativas, mas depois desisti se não houver retorno. Lembro logo dos organizadores de shows , que na maioria das vezes perdem grana até quando não aguentam mais! Quero ver qual é o zineiro que toma iniciativa de fazer um trabalho de maior qualidade gráfica, tendo que pagar por tradução, layout, arte, impressão profissional, entre outros…que por exemplo, gasta uns 5K e não consegue vender nem 3K do seu zine! Será que ele vai ficar dando murro em ponta de faca e fazer novas edições? Duvido muito!  Ou fica no zero a zero, ou o prejuízo é mínimo…senão meu amigo ele para ou volta a fazer da forma “artesanal”..com a velha impressão preto e branco e feito na impressora de casa.  A sexta edição do The Glory Of Pagan Fire Zine deveria sair esse ano…lá se vão 3 anos desde o último lançamento. Porém, quando estava pensando em fazer aquele velho rascunho com diversos nomes de bandas para convite e com ideias para uma nova edição, como falamos no início da conversa, me surgiu um problema sério de saúde, no qual tive que suspender qualquer pensamento em publicar uma nova edição por esses tempos. Fazer zine, como vocês mesmo sabem, requer tempo e dedicação. Fora que tem toda a logística  fora de casa/escritório que é a compra de papel, envelopes, tintas para impressão, idas e mais idas ao correio… Vou cuidar da saúde e focar para lançar essa nova edição no primeiro semestre de 2024…a chama nunca se apaga, apenas diminui por um período!

Sim, concordo com você! O cara não vai investir grana se não tem retorno, né!? Eu na primeira e segunda edição do Maléfica Existência Zine não sobrou nada, mas o zine se pagou. Ou seja: ficou no zero a zero. Mas a partir  da terceira, quarta e agora na quinta edição ele sempre se pagou, além de fazer bastante trocas, sobrou uma grana já para investir na próxima edição. Você também faz parte da staff da Lucifer Rising  e agora Lucifer Rex, por que o site mudou de nome ?

Giovan Dias: Você é um bom comerciante meu amigo…hehehe….tem zineiro que só fica no prejuízo mesmo! Sim, recebi em 2018, salve engano, o convite para fazer parte de um novo Portal, que seria a parte digital da revista Lucifer Rising. Eu não sabia nem pra onde ia um site, de como publicar ou como realmente usar para realizar  publicações. Mas de toda forma, aceitei e resolvi encarar esse desafio que é novidade na minha jornada no Metal! Aos poucos fui pegando a manha e hoje faço tudo apenas pela tela do celular, se necessário.  Para minha surpresa, naquele primeiro ano, chegou até meus ouvidos que estava sendo criticado por alguns zineiros. Você já imagina por que! Me senti o próprio João Gordo como traidor do movimento!! Hahahahaha!!! Um zineiro que agora fazia parte do mundo digital, o “inimigo número 1 dos zines impressos”. O Portal mudou de nome por alguns motivos internos, entre eles a mudança de “diretoria”, por assim dizer.  O grande amigo Sérgio Tululla é o dono do nome Lucifer Rising e foi ele que autorizou a criação do Portal e foi ele quem deu autonomia para o Lozano administrar integralmente o Portal. Com a saída do Lozano da Lucifer Rising , tivemos  em seguida problemas técnicos no site, no qual dependia sempre da atuação dele, que por muitas vezes sumia por motivos pessoais, além de já não ter mais nenhuma relação direta com o trabalho. Acabamos (redatores) decidindo em finalizar aquela atividade com o nome Lucifer Rising e termos autonomia, sem necessidade de dependência como estávamos passando naquele momento . Comunicamos a decisão ao Tululla, que entendeu nossas justificativas.  A administração naquele momento deixaria de ser uma espécie de imperialismo e passaríamos para um parlamentarismo…rsrsrsrs Foi nesse momento  que Lucifer finalizou sua ascenção e se tornou rei…. estava criada a Lucifer Rex”

Além de você editar o seu próprio zine impresso, fazer parte do já citado webzine, você participa também do “Warfare Book Zine” que é uma união de vários amantes de escritas do subsolo, que edita seus  próprios zine e que uniram forças por amor ao zine e ao Underground. Como você consegue tempo para conciliar família, trabalho e ainda fazer parte dessas congregações demoníacas de escritas subversivas? 

Giovan Dias: Tem que ter um pouco de planejamento e disciplina. E tem aquilo, se você pensar em abraçar o mundo de uma só vez você se fode legal!!!  Não dá para fazer tudo de uma vez…..eu mesmo que vou fazer alguma edição do The Glory, tenho que dá um tempo nas outras atividades…mesmo que seja por uma semana, já que também o zine não faço de uma vez só, tem suas etapas, desde elaborar a entrevista,  fazer resenhas, configurar páginas, etc…. Então nesse tempo tenho que deixar as outras atividades um pouco de lado, mas nunca 100%, não dá. Quanto ao Warfare Book zine foi outra grata atividade que tenho em meu currículo. Surgiu de uma parceira com Carlos Nephastorm (Pecatório Zine e diversos outros) e que hoje já parece uma. coperativa..hahahaha…..contamos com você (Maléfica Existência Zine), Samir (Crush the Cross Zine), Elton Lima (Visão Underground Zine / Manifesto em Fúria Zine), Robson Desgraça (Desgraça Zine), Hélia Magalhães (Morbid Warrior Zine/RIP), Louise Wagner (ex Brutal Morticínio) e Priscila Nunez (Submundo Productions). já tem um tempo que não produzimos nada, já que o responsável por  todo o layout, o Sr. Nephastorm só pensa em beber …kkkkkkk…mas uma hora dessa retornamos das sombras. Já a Lucifer Rex é que atualmente ocupa meu maior tempo, contudo também é onde a atividade pode ser feita com maior rapidez. Consigo fazer publicações utilizando o celular em qualquer local que esteja, sendo na fila de um banco, sentado numa mesa do bar, num uber, num metrô…então essa praticidade faz com que eu consiga ter uma atividade diária, sem exigir um tempo específico sentado na frente de um computador editando um zine impreso, por exemplo.  Claro que tem hora que exagero e a família reclama e agora minha saúde também…mas vamos dando um jeito para não deixar nada pendente….que é o maior risco quando se tem várias atividades….não pode deixar as coisas pendentes e acabar se queimando com bandas por exemplo que lhe manda material. Receber algo para resenhar e não publicar é algo impensável por aqui!

Pois é, cara! Eu nas duas primeiras edições do M.e.z. fazia no velho estilo dos anos 90. Ou seja: fazia as perguntas em um caderno,depois digitalizava no PC e copiava e  colava, enviava por e-mail para a banda e as resenhas da mesma forma. Hoje também faço tudo pelo celular, tudo mais fácil e mais rápido. Mas a próxima pergunta era sob esse lance entre o zine impresso e digital. Mas você já é um traidor!?(hahaha). Você prefere o zine impresso ou webzine?  

Giovan Dias: Hahaha..bem vindo ao time companheiro!!!! Voltando a pergunta, agora você me pegou … é o mesmo que perguntar a quem gosta de beber se prefere cerveja ou vinho! Eu diria que depende do local, do momento…sentado em casa, ouvindo um som, com uma das minhas gatas no colo, claro que prefiro abrir um zine e me deleitar por entre folhas subversivas…muitas vezes, por surpresa dos incautos nos zines impressos encontra-se conteúdos que não encontramos na internet , vide as diversas bandas ultra radicais e restritas que não querem nem ouvir falar de sites, devido ao acesso fácil e irrestrito.  Já naquele corre do dia a dia, acho o webzine hoje essencial. É de onde chegam as notícias rápidas, inéditas e praticamente em tempo real. Um falecimento, um lançamento, um anúncio de show… Resumindo, com equilíbrio dá para beber das duas fontes.

E meu amigo, você já é um Matusalém do Underground baiano e brasileiro. Me diz uma coisa, desde a época que você adentrou neste submundo o que mudou para melhor, o que precisa mudar e o que continua igual dentro do Underground nacional ?

Giovan Dias: Essa é uma pergunta difícil de responder de bate pronto. É necessário pensar muito e com certeza amanhã posso ter uma visão diferente de algo ou reformular meus pensamentos…..mas é óbvio que mudou nitidamente para melhor foi a facilidade de acesso aos lançamentos e todo tipo de material que é lançado, além das informações quase que imediatas sobre a nossa cena. Apesar de que, como tudo na vida, tem seus contras, né? Hoje até vovó sabe quem é um tal de Glen Benton que dizia que ia se matar com 33 anos!! Ficou muito bom para nós, headbangers, mas também facilitou para os curiosos e posers de plantão! É uma faca de dois gumes!  Outra coisa que percebo é a forma como cada vez mais todos os envolvidos nessa cultura subversiva tem evoluído na questão de qualidade dos seus trabalhos, sejam bandas, selo, zines, gravadoras…. saímos do amadorismo inicial e o Brasil está começando a ter até melhores destaques que muito trabalho gringo.  Acho que isso tempos atrás já precisava mudar e estamos chegando lá!  Velho, acho que algo que não muda nunca são as velhas tretas, fofocas, intrigas e brigas de ego. Mas isso também é natural do ser um humano que vive em comunidade ou em qualquer instituição social. É um micro que vemos no macro, nas empresas, nas escolas… acho que isso não vai mudar nunca.

Você é uma pessoa que mesmo vivendo o Metal/Underground há muito tempo é um cara antenado com o mundo atual e apesar de ser um Metalhead do século passado, ainda procura ouvir bandas novas ou só escuta bandas antigas, ou clássicas ?

Giovan Dias: Só escuto coisa antigas: WASP até o “Last Command”, Slayer até “Season The Abyss”, Manila Road, Judas, Nasty Savage, Hellhammer, Bathory…kkkkkkkkkkkkkk…tó de sacanagem!   Como você mesmo diz, vivo antenado com tudo que acontece atualmente e mesmo assim não dá para sacar tudo, é muita coisa! Devido a isso, tem CD que só ouvi uma vez na vida e que está há mais de dois anos guardado, pois sempre tem coisa nova para ouvir e você não consegue retornar para ouvir aquele CD novamente.  As vezes tento escutar algum clássico antigo, álbuns que fizeram história, mas tem muita coisa nova que chega todo dia ao mundo dos vivos e que é muito foda!

Verdade, muitos lançamentos e sempre tem bandas novas para conhecer. Mas apesar de os lançamentos nacionais como você mesmo disse, não deve nada para lançamentos gringo, porém tem muitos lançamentos que eu compro e escuto uma vez só e esqueço e muitas vezes pela qualidade da banda. E quais bandas você anda ouvindo atualmente, seja nacional ou gringa e indicaria para nossos leitores?

Giovan Dias: Eu na verdade não é pela qualidade da banda, e sim realmente, pela quantidade de material que vou adquirindo….e dizer que no início eram meia dúzia de discos e umas fitas gravadas com as piores qualidade possíveis…hahahaha O que ouvi ultimamente e chamou minha atenção  das bandas nacionais foi os mineiros do NECROTICUM, os goianos do NITIMUR IN VETITUM,  os paraenses do SÁDICO INFESTO, os cearenses do SYSYPHUS e NECROFILOSOPHY o projeto baiano do LAMENTO, fora bandas que já estão na estrada e lançaram esse ano álbuns muito foda como MORBID PERVERSION, ETERNAL SACRIFICE, PODRIDÃO, GRAVE DESECRATOR, WOLF’S LEGACE, HYNARIVM, JUSTABELLI… De bandas gringas gostei do novo álbum do OBITUARY, INCANTANTION, TJUDER, MARDUK, IMMORTAL e PROFANATICA…..escutei umas bandas que não sacava e gostei muito como DEATH REICH, INTO DARKNESS, MAVORIM,   TODVERHEXEN, BLACK BEAST, NECROFIER… Acho o Black Metal Grego o melhor no que faz, estou na expectativa do novo do VARATHRON em dezembro.Por agora o que me lembro são esses.

Então, cara, outra coisa que eu estava esquecendo e é muito importante para qualquer metalhead é a forte ligação que a grande maioria tem em seus gostos musicais, além do Rock / Metal, é a literatura e cinema, que anda de mãos dadas com o Rock. Você poderia nos dizer quais livros, escritores, filmes e diretores tu aprecias? E da literatura subversiva, quais zines você tem acompanhado, tem seu apoio e respeito, e que você indicaria aos leitores do site?

Giovan Dias: Nunca fui cinéfilo no sentido para indicar películas que valesse a pena assistir, que trouxesse grande conteúdo ou profundos ensinamentos. Antes da pandemia ia todo final de semana ao cinema, mais para assistir filmes triviais. Depois nem isso mais. Às vezes pesquiso no Facebook algum comentário de filme e vou assistir.. Cara, algo que estou devendo a mim mesmo é retornar com urgência ao hábito de leitura de livros. Desde tenra idade sou louco por livros e devido a correria do dia a dia e a “maldita” internet fui aos poucos diminuindo o hábito. Indicar os velhos autores e livros sobre ocultismo é chover no molhado, além do mais, sobre esse assunto atualmente acredito que cada um tem que achar por conta própria o seu caminho. Além dos clássicos, existem várias correntes do Caminho da Mão Esquerda que podem ser pesquisadas e aprofundadas. Eu mesmo, não muito tempo atrás iniciei o estudo de uma determinada Corrente, contudo não dei continuidade devido alguns princípios e “dogmas” não serem condizentes aos meus pensamentos, então pensei continuar como livre pensador e eterno estudioso/curioso.  Mas, pra não dizer que não indico especificamente nada de ocultismo, procurem as publicações que vem sendo feitas pela Manus Gloriae Editora.  Naamah Acharayim, a pessoa por trás destes trabalhos tem profundo conhecimento. No quesito filosofia indicaria hoje Emil Cioran, filósofo romeno contemporâneo muito amargo e pessimista….rsrsr….muitos irão gostar. Romances, como dito, estou desatualizado, mas indico para quem não conhece o britânico Ken Follet. Ele simplesmente publicou uma trilogia sensacional chamada “O Século”. São histórias de famílias que se entrelaçam passando pelas duas guerras mundiais na Europa até a posse de Barak Obama nos EUA. É fantástico! Outra trilogia que curtir muito foi “Millenium” do sueco Stieg Larsson, pena que ele morreu e tentaram dá continuidade a série, mas ficou à desejar. Saiu também em filme, mas quem ler um livro e assiste depois um filme sabe a decepção que é, por isso nem tentei assistir a série de Games of Thrones. Quando o livro parou no quinto, amaldiçoei George R. R. Martin por várias encarnações….Em relação aos zines , temos vários circulando no submundo, apesar de muitos acharem que já são peças de velhas bibliotecas particulares espalhadas pelo país.  Vou citar os que tive acesso recentemente mesmo com o seu, o Maléfica Existência e o do Elton, o Manifesto em Fúria. Li recentemente o Warriors of Darkness Horde Zine e estou aguardando chegar na nova edição do Sepulchral Voice Zine.  Nos últimos tempos fiquei muito empolgado com a nova edição do Revelações Abissais e do Manifesto do Fim do Mundo!  O Akkeldama Zine também é outro muito ativo, do grande Tiago Siqueira.  Mas cito vários outros como Death Metal Zine, Desgraça Zine, Pecatório Zine, Dark Gates, Pilares, Seraph , Mors Venit, Dissolve Coagula, Goar Macabre, Pagan Vastlands, Desgraça Nordestina, Prefácio Negro, Negra Alianças, Antichist’s Revelation, Harpias, The Return, Túmulo Maldito, Comando do Bode Negro….. tem mais, infelizmente não lembro no momento.

Então, na metade dos anos 90 eu descobri o Black Metal norueguês e ouvia bastante. Hoje continuo gostando, mas sempre até o segundo ou no máximo terceiro lançamento. A única banda norueguesa que ainda escuto tudo é o Immortal. O último realmente está muito bom! Hoje prefiro o Black Metal Grego. Giovan, obrigado por esse bate papo. Palavras finais suas. Estimo melhoras em sua saúde. Abraço & Força – Sempre!

Giovan Dias: Em qualquer lugar do mundo existirá bandas boas ou ruins…. mas acho que na Grécia tem menos…hahahaha…Eu que agradeço meu caro amigo por esse inteligente bate papo! Importante expormos nossas ideias e pensamentos, já que damos tanto espaço para os outros, uma hora tem que ser nossa vez, não é? Estimo que você, o Fábio Brayner e demais não sucumbam ao cansaço e desânimo que muitas vezes nos bate à porta, lutamos tanto, trabalhamos tanto pelo que acreditamos e somos pouco reconhecidos, quando não criticados pelo Tribunal Superior do Metal. rsrsrsrs Forte abraço e vamos manter essa aliança…já dizia um conhecido meu de Santa Catarina…” unidos somos mais forte!”.

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